OAB cria protocolo de ética para reduzir violência de gênero contra advogadas

OAB cria protocolo de ética para reduzir violência de gênero contra advogadas

A seccional de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil, presidida por Patrícia Vanzolini, anunciou nesta sexta-feira (24/3) a criação de um protocolo de atuação ética e profissional para orientar advogados e demais operadores do direito em relação a violência contra profissionais mulheres no exercício da profissão.

A iniciativa partiu de um estudo conduzido pelo Grupo de Pesquisa Carmin Feminismo Jurídico, da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Alagoas, que ouviu 190 advogadas de todos os estados do país.

O estudo apontou que 80,6% das advogadas já se sentiram ameaçadas no exercício da profissão em razão do seu gênero ou de suas clientes. Em 90,4% dos casos, a violência foi praticada por homens.

Dentre os agressores, 65,2% eram advogados da parte contrária e 46% eram magistrados.

A pesquisa, intitulada “Lawfare de gênero: a necessária e urgente construção de um protocolo para a atuação ética e profissional de integrantes da advocacia sob a perspectiva de gênero, a partir da pesquisa nacional para identificação de casos de violência de gênero contra advogadas em razão do exercício da profissão”, é de autoria de Soraia Mendes, Elaine Pimentel e Isadora Dourado.

“A gente não espera que vá fazer o protocolo e que na semana seguinte as coisas vão estar diferentes. Mas o protocolo é fundamental para começar a mudar a cultura” afirmou a coordenadora do estudo, Soraia Mendes, em evento da OAB-SP para anunciar a criação do protocolo.

Certeza da impunidade
O estudo apontou que 73,5% das vítimas não denunciaram a violência que sofreu e, dessas, 58,9% afirmam que se mantiveram em silêncio porque têm certeza da impunidade do agressor. 87,9% das entrevistadas acreditam que a OAB não prioriza a proteção das advogadas contra a violência de gênero no exercício da profissão.

Em entrevista à ConJur, Soraia Mendes afirmou que a OAB ainda é “território a ser desbravado” em termos de perspectiva de gênero, mas que tem boas expectativas de que o documento sirva como um marco dessa mudança cultural.

“Construímos um trabalho na academia a partir da experiência da advocacia e agora devolvemos esses resultados à casa da advocacia. A OAB ainda é um território a ser desbravado por nós”, afirmou a jurista, dizendo confiar no comprometimento da presidente da seccional, Patrícia Vanzolini.

Para a presidente, o protocolo terá função principalmente pedagógica. “Claro que, em casos graves, não podemos deixar de punir. Mas o protocolo é mais do que simplesmente criar uma nova infração. Ele dá esclarecimento e balizas”, afirmou Patrícia Vanzolini à ConJur.

“Entendo que há advogados que não sabem até que ponto podem ir na defesa de um cliente. Já me pediram para anexar em processo fotografias de vítima de estupro para mostrar que ela era sexualmente disponível. Eu, que tenho perspectiva de gênero, não vou fazer isso, mas um colega pode não ter essa visão”, exemplifica a presidente, que atua na área criminalista.

“A existência do protocolo vai mudando essa cultura. Em termos de punição, o avanço mais importante é a rápida aprovação da mudança do nosso estatuto”, acrescentou.

“Essa advogadazinha”
No estudo, algumas das agressões sofridas pelas profissionais foram descritas em detalhes. “Temos uma quantidade imensa de documentos comprobatórios das mais diversas violências”, afirmou Soraia.

“Essa advogadazinha é burra, processe ela, essa menininha não sabe o que faz”, relatou uma participante da pesquisa sobre agressão que sofreu durante o exercício de seu trabalho.

“Sugerir que vitórias decorreriam de sexo com magistrados, sugerir ser amante dos clientes, sistematicamente colocar em posição coadjuvante frente a profissionais do sexo masculino, entre outras práticas”, descreveu outra.

“Me chamar de feminazi, dizer que violência de gênero é mimimi, que o protocolo do CNJ para julgamento sob perspectiva de gênero é bobagem, não deferir pedidos feitos por advogada quando defere o mesmo pedido a advogado homem, debochar em audiência, interromper, assediar sexualmente”, relatou outra.

As autoras da pesquisa também chamaram atenção para o fato de que 83,6% das entrevistadas dizem acreditar que atuar em causas pautadas em violência de gênero as tornam mais vulneráveis a esse tipo de violência.

Participaram da mesa, além da presidente da secional, Patrícia Vanzolini, e da coordenadora do estudo, Soraia Mendes, as autoras da pesquisa Isadora Dourado e Elaine Pimentel, Luanda Pires, diretora do MeToo Brasil, Cláudia Luna, vice-presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB SP para a área da Mulher Advogada, Isabela Castro de Castro, Presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB SP, Ana Carolina Lourenço, vice-presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB SP, Alexandra Rodrigues, secretária-geral da Comissão de Direitos Humanos da OAB SP e Heloisa Alves, presidente da Comissão da Diversidade Sexual da OAB SP.

Com informações do Conjur

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