Os julgadores da Nona Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-MG) deram provimento ao agravo de petição interposto pelos proprietários de um imóvel penhorado para pagamento da dívida trabalhista, reconhecendo a boa-fé na aquisição do imóvel e afastando a existência de fraude à execução. Isso porque o imóvel foi adquirido pelos agravantes em contrato de compra e venda firmado com o devedor, antes de qualquer registro de indisponibilidade ou penhora sobre o bem, embora já estivesse em curso a ação que originou a dívida trabalhista.
Após terem o imóvel penhorado no processo de execução trabalhista, os proprietários ajuizaram embargos de terceiros, julgados improcedentes em sentença oriunda da 29ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, sob o fundamento de que a aquisição configuraria tentativa de fraude à execução. Mas, em decisão de relatoria da desembargadora Maria Stela Álvares da Silva Campos, o colegiado reformou a sentença, com base na jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
“Diversamente do que se entendeu na origem, a jurisprudência mais abalizada do STJ sinaliza necessidade de avaliação prudente e profunda da boa-fé do terceiro adquirente de bem imóvel, inclusive atribuindo validade a contrato particular de compra e venda como forma de demonstrar a legitimidade do negócio jurídico e da posse do bem. Nesse sentido, as Súmulas 84 e 375 do STJ”, destacou a relatora.
O imóvel, que pertencia aos devedores do crédito trabalhista, foi adquirido pelos agravantes por meio de compromisso de compra e venda firmado em setembro de 2023, com a escritura devidamente registrada em cartório em outubro do mesmo ano. O negócio jurídico foi realizado mediante pagamento em espécie, no valor de R$ 260 mil.
A relatora verificou que, na época do registro da compra e venda, não havia qualquer averbação de indisponibilidade na matricula do imóvel. Dessa forma, os agravantes não tinham ciência de possíveis embaraços do imóvel em relação a devedores trabalhistas, até porque consta do referido registro que, quando da compra do bem, não havia ações pessoais ou reais que atingissem ou pudessem atingir o imóvel objeto da matrícula.
Segundo pontuou a desembargadora, apesar de a ação que deu origem à dívida trabalhista ter sido ajuizada em junho de 2022, ou seja, anteriormente à alienação, não há como se falar em fraude à execução, diversamente do que se entendeu na decisão de primeiro grau, por não haver qualquer indício de que os agravantes agiram de má-fé ao adquirir o imóvel. Ressaltou ainda que a boa-fé dos adquirentes se presume, sendo necessário provar a má-fé — o que não ocorreu no caso.
Conforme constou da decisão, o artigo 792 (incisos I a V) do Código de Processo Civil (CPC) dispõe que incorre em fraude à execução o devedor que realiza a alienação ou a oneração de bens quando sobre a coisa pender ação fundada em direito real, desde que a pendência tenha sido averbada em registro no registro público, se houver; quando averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução; quando tiver sido averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial originário do processo onde foi arguida a fraude; quando ao tempo da alienação corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência; e nos demais casos previstos em lei.
Conforme ponderou a relatora, em razão da segurança que se dever dar aos contratos e negócios jurídicos, para a caracterização da fraude à execução é imprescindível a existência de indícios de má-fé ou registros públicos que alertem terceiros sobre restrições ao bem. “No caso, não se comprovou a má-fé dos adquirentes, nem se demonstrou a alegada fraude, com a necessária ciência dos adquirentes da potencialidade de tal alienação gerar insolvência dos executados”, destacou.
O acórdão aplicou o entendimento da Súmula 375 do STJ, segundo a qual “o reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”. E considerou que: “ – As provas coligidas aos autos apontam em direção diametralmente oposta, tendo sido demonstrado que não havia registros de impedimento sobre o bem imóvel adquirido pelo terceiro-embargante, restando configurada a boa-fé deste”, sublinhou a relatora.
Com a decisão, o Tribunal determinou o cancelamento da indisponibilidade lançada sobre o imóvel de propriedade dos agravantes.