Juíza reconhece vício oculto e aplica teoria do desvio produtivo do consumidor em favor de motorista de aplicativo prejudicado pela demora no conserto e reembolso.
A juíza Lídia de Abreu Carvalho, da 4ª Vara Cível de Manaus, julgou parcialmente procedente ação de rescisão contratual movida contra a empresa Diamantino & Cia Ltda. (Du Norte Veículos), reconhecendo a existência de vício no produto, o descumprimento do prazo legal para reparo e a responsabilidade civil da revendedora pelos prejuízos materiais e morais causados ao comprador.
De acordo com os autos (proc. 0496130-59.2024.8.04.0001), o autor adquiriu um veículo usado, modelo Renault Sandero, pelo valor de R$ 58.387,15, para utilizá-lo como instrumento de trabalho como motorista de aplicativo. O automóvel foi entregue um mês depois, mas apresentou defeito no câmbio no mesmo dia.
Após diversas tentativas de reparo, o problema não foi solucionado dentro do prazo de 30 dias previsto no art. 18, §1º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), levando o comprador a solicitar a rescisão do contrato e a devolução dos valores pagos.
A magistrada observou que, embora o carro fosse usado, a revendedora permanece responsável por vícios ocultos que tornem o bem impróprio para o consumo, sendo irrelevante a cláusula de venda “no estado em que se encontrava”. Destacou ainda que o próprio documento interno da empresa reconheceu o descumprimento do prazo de reparo, o que configurou confissão da falha.
“O caso ultrapassa o mero dissabor e configura efetivo dano moral. A conduta da ré se prolongou no tempo, forçando o consumidor a um calvário para resolver a questão”, escreveu a juíza, aplicando a teoria do desvio produtivo do consumidor, reconhecida pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O juízo reconheceu que o autor comprovou prejuízos materiais com o pagamento de parcela do financiamento (R$ 1.740,47), perda de dias de trabalho e aluguel de outro veículo para manter sua renda, determinando que os valores sejam apurados em liquidação de sentença. Já o dano moral foi fixado em R$ 2 mil, acrescidos de correção monetária e juros.
A decisão também determinou a rescisão do contrato de compra e venda, com retorno das partes ao status quo ante, e condenou a revendedora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios de 15% sobre o valor da condenação. A juíza rejeitou apenas o pedido de ressarcimento por juros de empréstimo, por ausência de nexo causal comprovado.
O julgamento destaca a aplicação conjunta dos arts. 18 e 20 do CDC e do art. 475 do Código Civil, segundo os quais o consumidor pode exigir a resolução do contrato e indenização por perdas e danos diante do inadimplemento do fornecedor. O entendimento também reforça que, para bens essenciais como o veículo utilizado para o trabalho, o consumidor não precisa aguardar o prazo de 30 dias para exercer seu direito à substituição ou devolução.
Processo nº 0496130-59.2024.8.04.0001
