O Estado é responsável por mortes ou ferimentos de pessoas decorrentes de operações de segurança pública. Com esse entendimento, a 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que a Fazenda Pública do Estado de São Paulo deve indenizar o pai de um homem baleado e morto na região conhecida como “Cracolândia”, na capital paulista.
Paulo Pinto/Agência Brasiloperação policial na cracolândia
Pai de homem morto em operação na ‘Cracolândia’ será indenizado pelo Estado
Segundo o processo, um homem foi baleado e morreu durante conflito entre policiais militares, guardas civis e usuários de drogas na Praça Princesa Isabel, na região central da cidade.
O pai da vítima processou o governo estadual e pediu indenização por danos morais, alegando que um policial militar teria atirado contra seu filho. Em primeiro grau, o juiz rejeitou a pretensão alegando que não havia prova de que o disparo que o matou tenha vindo de um policial.
O autor recorreu e pediu a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, já que o juiz julgou a ação improcedente por falta de provas das alegações, mas não permitiu a produção da prova.Ele também alegou que o arquivamento do inquérito na esfera penal não gera coisa julgada na esfera cível, e disse que há vídeos divulgados que mostram policiais atirando contra a multidão.
Na ação, os policiais e guardas se defenderam afirmando que agiram em legítima defesa, já que uma multidão de pessoas estava descontrolada e corria na direção dos agentes. As provas colhidas nos autos, todavia, desmentiram a versão dos agentes.
Responsabilidade objetiva
Vídeos de testemunhas mostraram os guardas e policiais encurralando a multidão durante a ação. Além disso, o laudo necroscópico descartou a possibilidade de a vítima ter sido atingida por ricochete, o que afastou outra alegação dos policiais, de que teriam atirado para o chão para afastar a multidão.
O contexto da morte do homem, portanto, era aferível pelas provas que já constavam nos autos, de acordo com o desembargador Marcelo Semer, relator do caso. Ele rejeitou a preliminar de cerceamento de defesa, mas reconheceu que há responsabilidade objetiva do Estado no caso e, portanto, dever de indenizar.
O desembargador fundamentou sua tese no Tema 1.237 do Supremo Tribunal Federal, que fixou a tese de que o Estado pode ser responsabilizado, na esfera cível, por danos em operações policiais, mesmo quando a origem do disparo não é identificada. “No caso concreto, a prova deveria ter sido feita pelo Estado no sentido de demonstrar a culpa exclusiva da vítima, que não teria dado outra alternativa ao agente estatal senão atirar com munição letal, em estrito cumprimento de dever legal ou legítima defesa”, disse.
Semer determinou o pagamento de R$ 100 mil em indenização por danos morais ao pai da vítima. “Não consta que qualquer um dos indivíduos em situação de rua/abuso de drogas estivesse armados, não tendo o Estado se desincumbido de seu ônus de provar que realmente estariam e que, além disso, teriam desferido tiros contra policiais, de modo a viabilizar a versão estatal de atuação em legítima defesa, com meios proporcionais”, escreveu o desembargador.
A votação foi por maioria. Ficou vencido o desembargador Antonio Celso Aguilar Cortez.
Processo 1009425-10.2022.8.26.0084
Com informações do Conjur