A disputa era bilionária e silenciosa: municípios e estados de um lado, União do outro. O campo de batalha: os repasses do FUNDEF/FUNDEB, especialmente a complementação calculada sobre o Valor Mínimo Anual por Aluno (VMAA). A dúvida jurídica parecia um detalhe técnico, mas tinha potencial para definir quem perderia — ou ganharia — anos inteiros de recursos.
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região havia entendido que o prazo prescricional era anual: a cada exercício, abria-se uma janela para cobrar todo o repasse daquele ano. Esse modelo favorecia os entes federativos, porque permitia reclamar quantias acumuladas de uma só vez.
A União recorreu. Levou a tese ao Superior Tribunal de Justiça e pediu uma mudança de chave: que a prescrição fosse mês a mês, já que os repasses não são feitos em parcela única, mas em doze cotas ao longo do ano. Assim, em vez de um “ano inteiro” prescrever de uma só vez, cada mês seria contado separadamente.
No julgamento do Tema Repetitivo 1326, a Primeira Seção do STJ, sob relatoria do ministro Teodoro Silva Santos, deu razão à União. Aplicou o princípio da actio nata e enquadrou os repasses como relação de trato sucessivo: cada pagamento (ou falta dele) gera, por si, o nascimento do direito de cobrar. Resultado: não prescreve o direito de cobrar a complementação como um todo, mas prescrevem mês a mês as parcelas que ficaram para trás, limitadas ao quinquênio anterior à ação.
Com isso, a tese ficou assim fixada:
“O prazo prescricional da pretensão de cobrança de complementação de recursos relativos ao Valor Mínimo Anual por Aluno (VMAA), repassado ao FUNDEF/FUNDEB, deve ser apurado mês a mês, e não anualmente, por cuidar de hipótese de relação de trato sucessivo, que se renova mensalmente, não havendo falar de prescrição do próprio fundo de direito, mas apenas das parcelas relativas ao quinquênio que precedeu à propositura da ação.”
Na prática, a vitória é da União: os entes federativos continuam podendo ingressar com ações, mas só conseguem recuperar as parcelas dos últimos cinco anos, mês a mês, sem resgatar blocos anuais inteiros.
O recurso teve origem no Amazonas, a partir de ação movida por ente local para cobrar complementações do FUNDEF/FUNDEB que entendia devidas pela União. O caso percorreu a Justiça Federal da 1ª Região e chegou ao STJ, de onde foi escolhido como paradigma para julgamento sob o rito dos recursos repetitivos.
REsp 2154735 / AM