Fracionar ações idênticas sobre uma mesma relação contratual, distribuindo pedidos repetidos de restituição e indenização moral, constitui prática temerária e ofensiva à boa-fé processual. O expediente, além de induzir o juízo a erro e gerar sentenças maculadas por bis in idem, afronta o art. 5º do CPC e o art. 2º da Lei 9.099/95, que consagram o dever de lealdade e cooperação das partes.
Com esse entendimento, o juiz Caio César Catunda de Souza, do Juizado Especial Cível de Manaus, indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo sem resolução do mérito, em ação proposta contra o Banco Bradesco. O magistrado constatou que o autor havia ajuizado duas outras demandas idênticas, no mesmo dia, com idêntico conteúdo, provas e fundamentação, todas patrocinadas pelo mesmo advogado.
As ações, segundo o juiz, tinham por objeto descontos realizados na mesma conta bancária do autor, ainda que sob rubricas distintas — “Mora Crédito Pessoal” e “Parcela Crédito Social” —, configurando, assim, fracionamento indevido de pretensões oriundas de um único vínculo contratual. A prática, destacou, viola os princípios da economia processual e da boa-fé, além de representar abuso do direito de ação, tipificado no art. 187 do Código Civil.
Na sentença, o magistrado pontuou que “o ajuizamento de múltiplas ações com causa de pedir idêntica, todas pleiteando a devolução em dobro e indenização por danos morais, induz o Judiciário a erro e compromete a segurança jurídica, podendo gerar condenações em duplicidade”. Por essa razão, reconheceu a litigância de má-fé, nos termos do art. 80, III e V, do CPC, e aplicou o art. 330, III, combinado com o art. 485, I, para extinguir o feito.
O juiz ainda determinou o envio de cópia integral dos autos à NUMOPEDE, a fim de que sejam adotadas as providências cabíveis quanto à conduta do advogado, diante de possível infração ao art. 34, IV, da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia). Segundo o magistrado, tais expedientes “abarrotam o Poder Judiciário, prejudicam a celeridade processual e fomentam o descrédito social quanto à boa utilização das vias judiciais”.
“A malícia de pleitear repetidamente, forçar o reexame de períodos contidos em outros processos, distribuídos no mesmo dia, denota a pretensão de obter vantagem ilícita sobre cada possível condenação da reclamada, montando o mosaico do abuso do direito de ação, que se deve coibir”, registrou a sentença.
Autos nº 0664507-66.2025.8.04.1000
