DPE-AM abre caminhos para ampliar o acesso de pacientes a medicamentos do SUS

DPE-AM abre caminhos para ampliar o acesso de pacientes a medicamentos do SUS

Atuação como ‘custos vulnerabilis’ visa garantir que qualquer pessoa possa ter acesso a medicamentos gratuitos, mesmo com receita de médico particular

O Poder Judiciário reconheceu formalmente a atuação da Defensoria Pública do Amazonas (DPE-AM) como custos vulnerabilis no processo que garantiu a médicos particulares o direito de prescrever receituário e laudos para dispensação de medicamentos especializados de alto custo pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

A decisão da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) abre caminho para consolidar a atuação da Defensoria Pública brasileira na defesa dos interesses difusos de toda e qualquer pessoa que venha a precisar ter acesso à política de assistência farmacêutica. Isso porque o caso tende a subir aos Tribunais Superiores, podendo criar um precedente de repercussão em todo o território nacional.

Solicitada pelo defensor Arlindo Gonçalves Neto, coordenador do Núcleo de Defesa da Saúde (Nudesa), a entrada da Defensoria Pública na apelação cível ajuizada pela Sociedade Amazonense de Reumatologia contra uma decisão de primeira instância foi acatada pelo colegiado do TJAM, que alterou o acórdão da decisão.

Arlindo Gonçalves explica que, apesar de ter sido ajuizada por uma associação de médicos reumatologistas, a ação impacta toda a sociedade, “uma vez que, nas diversas especialidades médicas, às vezes, por haver demora na fila da rede pública, o paciente acaba procurando o atendimento no setor privado”.

“E, quando faz essa busca pelo médico particular, o paciente deixa de ter acesso ao medicamento gratuito. Então, essa ação tem uma repercussão importante no atendimento prestado pelo SUS”, acrescenta.

Considerando que, apesar da decisão do TJAM ser favorável ao entendimento da DPE-AM, o caso poderá ter novos desdobramentos, a Defensoria Pública solicitou a habilitação no processo.

“É importante que a decisão dada pelo Tribunal de Justiça se mantenha nos Tribunais Superiores, de modo a assegurar a universalidade no acesso à política de assistência farmacêutica”, ressalta o defensor Arlindo Gonçalves.

Por essa razão, conforme o defensor, a Defensoria Pública entendeu ser necessária a sua intervenção como custos vulnerabilis, já que não havia quem defendesse os interesses difusos dos pacientes nesta disputa judicial.

O defensor explica que, da forma como a relação processual se estabeleceu, de um lado, a associação de reumatologistas defende o seu interesse, “que é um interesse válido, mas restrito a uma classe de profissionais, notadamente os médicos especialistas em reumatologia”. “Eles estão defendendo o seu interesse de prescrever o medicamento”, resume Arlindo Gonçalves.

“E, do outro lado, o Estado está defendendo o seu interesse em reduzir o acesso e mantê-lo restrito aos pacientes que tenham receita emitida pelo SUS”, acrescenta o defensor.

“Só que essa é uma ação que traz repercussões no próprio acesso ao direito a medicamentos pela rede pública, que é garantido constitucionalmente a toda e qualquer pessoa. E, embora ela traga uma repercussão, não havia ninguém, nenhum ator nos autos falando sobre o interesse do paciente. Estava faltando um ponto do tripé dessa relação jurídica, que é o olhar dos pacientes, e a defesa desse interesse ainda não estava sendo realizada nos autos desse processo”, enfatiza.

Habilitação na ação judicial
O defensor Arlindo Gonçalves Neto explicou que havia solicitado ao TJAM, desde o ano passado, o ingresso da Defensoria Pública como custos vulnerabilis, mas o pedido acabou não sendo apreciado pela Corte.

Após a decisão colegiada do TJAM reconhecendo o direito dos profissionais da medicina, o defensor apresentou embargos de declaração para garantir a presença da Defensoria Pública nas próximas etapas do processo judicial, considerando que a Procuradoria Geral do Estado (PGE) já manifestou interesse em recorrer, o que levará o caso ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e, possivelmente, ao Supremo Tribunal Federal (STF).

A Terceira Câmara Cível admitiu omissão quanto ao pedido de habilitação da DPE-AM e atualizou o acórdão, sem mudança no mérito da decisão. Os magistrados reconheceram que a demanda da Defensoria Pública para atuar como custos vulnerabilis possui caráter estrutural e social relevante, preenchendo os requisitos definidos pelo STF: a vulnerabilidade dos destinatários da tutela jurisdicional, o elevado grau de desproteção judicial dos interesses envolvidos e a pertinência institucional da intervenção.

O defensor Arlindo Gonçalves explica que, a partir de agora, já habilitada como custos vulnerabilis a Defensoria do Amazonas passa a se pronunciar nos autos do processo. “Inclusive vamos apresentar as contrarrazões ao recurso de embargos de declaração oposto pelo Estado do Amazonas e seguir, daí em diante, até a última instância, até o trânsito em julgado dessa ação, que esperamos que tenha um desfecho positivo, no sentido de assegurar direitos relacionados ao acesso ao Sistema Único de Saúde”, conclui.

Atuação extrajudicial
A Defensoria do Amazonas também vem atuando de forma extrajudicial para ampliar o acesso a medicamentos do SUS.

Em julho deste ano, instaurou um Procedimento Coletivo (PC) para apurar o cumprimento dos princípios constitucionais de universalidade e equidade na política pública de medicamentos no Estado do Amazonas, além da transparência na divulgação de informações sobre estoques e acesso a medicamentos.

O procedimento do Nudesa recomenda, entre outros pontos, que a Secretaria de Estado da Saúde (SES-AM) promova acesso aos medicamentos incorporados ao SUS dispensados pela rede estadual, mesmo que a receita tenha sido emitida por um médico particular.

Em agosto, a Defensoria Pública instaurou uma série de PCs para apurar falhas no acesso a medicamentos no âmbito das secretarias municipais de Saúde em todos os 62 municípios amazonenses. Os procedimentos também questionam se as secretarias disponibilizam medicamentos independentemente da origem da receita, se de médico do SUS ou particular.

Sobre o custos vulnerabilis
Custos vulnerabilis é uma expressão em latim que significa “guardião dos vulneráveis”. O instrumento garante a atuação institucional da Defensoria Pública em defesa dos direitos dos grupos vulneráveis, mesmo que eles já tenham um advogado, dando cumprimento à sua missão constitucional de tutela de direitos humanos.

A tese doutrinária foi elaborada pelo defensor público Maurilio Casas Maia, da DPE-AM, na obra “Custos vulnerabilis constitucional: o Estado Defensor entre o REsp 1.192.577-RS e a PEC 4/2014”, publicada em junho de 2014 na Revista Jurídica Consulex.

Em diferentes contextos, a tese vem sendo aceita pelo TJAM desde 2016, tendo sido acolhida expressamente pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 2019 e, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2023.

Em decisão publicada no dia 12 deste mês, a Quinta Turma do STJ, por unanimidade, definiu que a Defensoria Pública pode atuar como custos vulnerabilis na execução penal, mesmo na presença do advogado constituído, para garantir a defesa dos apenados.

O caso concreto julgado no STJ teve origem no Maranhão e discutiu um pedido de saída temporária para um apenado. Apesar de ter um advogado particular, havia o risco omissão da defesa. Diante da situação, a Defensoria Pública do Maranhão assumiu o caso e formulou o pedido de saída, visando garantir que o direito do apenado não fosse violado.

Apesar de a ação ter sido contestada, o STJ entendeu que a Defensoria do Maranhão estava atuando de forma legítima. A Corte reconheceu que o papel de custos vulnerabilis não se sobrepõe ao advogado particular, mas o complementa, atuando em casos de omissão para garantir a proteção de direitos humanos.

Fonte: comunicação Social da DPE-AM

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