Mesmo passados alguns meses dos crimes investigados, a Ministra Cármen Lúcia, do STF, entendeu que persistem motivos atuais e concretos para a prisão preventiva do oficial do Exército acusado de comandar uma ação que resultou na morte de garimpeiros na Base de Palimiú, em Roraima.
Segundo a decisão, a contemporaneidade da medida cautelar está vinculada não à data dos fatos, mas à permanência dos riscos à instrução processual e à ordem militar.
O habeas corpus foi impetrado pela defesa do 2º Tenente Fábio Luis dos Santos Geraldo, cuja prisão havia sido decretada pelo Superior Tribunal Militar (STM) a pedido do Ministério Público Militar. O oficial responde por homicídio qualificado (art. 205, §2º, do CPM), ocultação de cadáver (art. 211 do CP) e inutilização de material probante (art. 352 do CP), no contexto de uma operação militar ocorrida em 21 de setembro de 2023, no território Yanomami.
A defesa alegava nulidade do acórdão do STM por ausência de contraditório prévio quanto a novos depoimentos apresentados pelo Ministério Público Militar às vésperas do julgamento do recurso em sentido estrito. Tais elementos, conforme apontado pela defesa, teriam sido decisivos para a decretação da custódia, sem que a parte pudesse se manifestar.
No entanto, a Ministra relatora rejeitou o pedido, considerando legítima a aplicação do contraditório postergado em medidas cautelares, com base no art. 282, §3º, do Código de Processo Penal. De acordo com o voto, a juntada de elementos sigilosos — como depoimentos de militares que teriam mudado suas versões e reforçado a participação direta do oficial — não comprometeu o devido processo legal, pois não foram os únicos fundamentos da prisão, mas sim reforços a um quadro já robusto de indícios.
Gravidade concreta e periculosidade
A decisão reforça a jurisprudência do STF no sentido de que a gravidade concreta do crime, evidenciada pelo modus operandi e pelo risco de reiteração ou obstrução da instrução, justifica a custódia cautelar. Segundo os autos, o tenente comandava a embarcação militar que perseguiu e abordou os garimpeiros, tendo supostamente ordenado e executado a ocultação dos corpos com uso de cordas e pesos, além de ameaçar testemunhas e manipular relatos dos subordinados.
Trechos de depoimentos colhidos no Inquérito Policial Militar revelam que a versão inicialmente apresentada pelos militares teria sido combinada para encobrir os fatos. O conteúdo dos relatos aponta que o oficial teria coagido subordinados e usado de sua posição hierárquica para silenciar os envolvidos.
Hierarquia e disciplina militar
Além da ordem pública e da conveniência da instrução, a Ministra também considerou presentes os fundamentos da alínea “e” do art. 255 do Código de Processo Penal Militar: a necessidade de preservação da hierarquia e da disciplina nas Forças Armadas. Para Cármen Lúcia, a permanência do acusado em liberdade representa risco institucional, pois “coloca em xeque a ordenação da autoridade e as instituições militares, utilizadas, por ele, para o acobertamento de crimes”.
Decisão e fundamentos finais
Ao negar seguimento ao habeas corpus, a Ministra ressaltou que o Superior Tribunal Militar apresentou fundamentação idônea e alinhada à jurisprudência do Supremo. A decisão destacou que a prisão cautelar, embora excepcional, é compatível com a proteção da instrução penal e da ordem institucional quando há elementos que indicam a continuidade de riscos.
“Demonstrada a garantia da ordem pública e a periculosidade do agente, igualmente se revela caracterizado o requisito da conveniência da instrução criminal (…) Inegável, pois, o periculum libertatis em relação ao Oficial”, concluiu o STM, posição que foi acolhida integralmente pelo STF.