Servidor estadual comprovou atraso de cinco anos na implantação do benefício, e juiz determinou o pagamento das parcelas atrasadas, com reflexos salariais e atualização monetária
O Juizado Especial da Fazenda Pública de Manaus condenou o Estado do Amazonas e a Secretaria de Estado de Saúde (SUSAM) ao pagamento retroativo do abono de permanência devido a um servidor que teve o benefício reconhecido administrativamente, porém, implantado em folha apenas cinco anos depois do deferimento.
Na sentença, o juiz Gonçalo Brandão de Sousa entendeu que a morosidade injustificada da Administração em efetivar o direito já reconhecido não afasta o dever de indenizar o servidor pelas parcelas atrasadas, com reflexos em 13º salário e 1/3 de férias. A decisão transitou em julgado.
Abono reconhecido, mas pago com atraso
O magistrado destacou que o abono de permanência é uma vantagem de natureza remuneratória, prevista no artigo 40,§19, da Constituição Federal, devida ao servidor que já completou os requisitos para aposentadoria voluntária, mas optou por permanecer em atividade.
Embora a Administração tenha reconhecido o direito do servidor bem antes, o pagamento só foi implementado cinco anos depois, o que, segundo o juiz, gera direito às diferenças retroativas.
“O abono de permanência não constitui liberalidade do Estado, mas um direito subjetivo de quem permanece em exercício após adquirir o direito de se aposentar. A demora administrativa não pode servir para suprimir ou adiar a fruição desse direito”, registrou o magistrado.
Suspensão da prescrição e mora administrativa
Ao analisar a prescrição, o juiz aplicou o art. 4º do Decreto nº 20.910/1932, reconhecendo que o prazo fica suspenso enquanto o pedido administrativo estiver em análise. O requerimento foi apresentado dentro do prazo legal de cinco anos, e o Estado só decidiu sobre ele em 27 de novembro de 2024, razão pela qual nenhuma parcela foi considerada prescrita.
O entendimento adotado segue precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ), como os julgados nos recursos AgRg no REsp 1.450.490/GO e REsp 1.732.001/PR, que firmaram que a Administração não pode penalizar o servidor pela própria demora.
“O requerimento administrativo formulado dentro do prazo suspende a prescrição, não podendo o servidor ser penalizado pela lentidão do Estado em reconhecer seu direito”, assinalou o juiz.
Sem violação à Lei de Responsabilidade Fiscal
A sentença também afastou a tese de que o pagamento retroativo violaria os limites de despesa com pessoal da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Segundo o juiz, o STJ já pacificou o entendimento de que a LRF não pode ser invocada para descumprir direitos subjetivos de servidores públicos.
“A concessão de efeitos patrimoniais pretéritos encontra respaldo na exceção prevista no art. 22, parágrafo único, inciso I, da LRF”, destacou o magistrado, reforçando que a legalidade do gasto não se confunde com a demora no cumprimento do dever.
Cálculo das diferenças e atualização
A decisão detalha os critérios de correção monetária e juros, conforme as alterações introduzidas pela Emenda Constitucional nº 113/2021 e pela Lei nº 10.406/2024 (novo Código Civil): Até novembro de 2021: correção pelo IPCA-E e juros pelos índices da poupança; A partir de dezembro de 2021: aplicação exclusiva da taxa Selic até o pagamento final.
Direito constitucional e natureza remuneratória
A sentença reforça a jurisprudência de que o abono de permanência é verba constitucional de natureza remuneratória, e gera efeitos financeiros a partir do momento em que o servidor adquire o direito. A demora administrativa, nesse contexto, não interrompe a exigibilidade do benefício, mas apenas posterga indevidamente o pagamento, dando causa à condenação.
“A mora administrativa viola os princípios da eficiência e da segurança jurídica, impondo à Administração o dever de reparar os efeitos do atraso”, pontuou o juiz.
Processo n.: 0073469-30.2025.8.04.1000
