A cláusula que permite atrasar a entrega de um imóvel só é válida se indicar, de forma clara, qual é o prazo máximo desse atraso. Quando esse limite não é informado no contrato, o direito do consumidor à informação é desrespeitado, e a construtora pode ser obrigada a pagar indenização pelos prejuízos causados.
Sentença da 5ª Vara Cível de Manaus declarou a nulidade de cláusula contratual genérica que previa tolerância para entrega de imóvel adquirido na planta sem indicar prazo definido, e condenou a incorporadora responsável ao pagamento de lucros cessantes, danos emergentes, cláusula penal e indenização por danos morais. A decisão foi proferida pelo juiz José Renier da Silva Guimarães.
A controvérsia girou em torno do atraso na entrega de imóvel prometido em prazo pré fixado, cujas chaves só foram entregues pouco mais de dois anos depois. A construtora alegava respaldo contratual para a postergação, com base em cláusula de tolerância prevista no contrato. No entanto, o magistrado considerou a cláusula abusiva por ausência de estipulação clara do prazo adicional, o que viola o dever de informação ao consumidor, previsto no CDC.
“Empresas de grande porte, com vasta experiência no mercado, devem prever prazo razoável quando do lançamento do empreendimento, evitando criar expectativas inócuas nos consumidores”, afirmou o juiz, destacando a necessidade de respeito à boa-fé objetiva e ao equilíbrio contratual.
Com base na jurisprudência do STJ (REsp 1.582.318/RJ), o juízo reconheceu que a cláusula de tolerância só é válida quando expressa, destacada e com prazo definido, de até 180 dias. Sua ausência autoriza o reconhecimento da mora a partir do término do prazo originalmente pactuado.
A sentença condenou a construtora ao pagamento de: Lucros cessantes, calculados em 0,5% do valor venal do imóvel por mês de atraso com juros e correção monetária; cláusula penal moratória, sobre o montante das parcelas efetivamente pagas; danos emergentes, no valor de R$ 7.200,00, referentes aos aluguéis pagos durante o período em que o imóvel não foi entregue; danos morais, fixados em R$ 15 mil, com fundamento no abalo existencial causado à autora pela postergação de seu projeto de vida familiar.
Ao reconhecer o dano moral, o magistrado afirmou que não se tratava de mero inadimplemento, mas de violação relevante a direito da personalidade, pela frustração do direito de uso do imóvel e adiamento injustificado de planos existenciais. “Não se trata de simples atraso na obra, mas do atraso no projeto de vida de uma família”, registrou.
Processo nº 0626300-32.2018.8.04.0001