Uma dona de casa de Manaus passou por constrangimento ao tentar realizar uma compra a prazo em um comércio do bairro. Na hora de fechar o negócio, foi surpreendida pela atendente: seu nome estava “sujo” no cadastro de inadimplentes. Sem poder concluir a compra e sob o olhar de terceiros, teve de se retirar da loja.
Curiosa sobre a origem do problema, consultou o sistema de proteção ao crédito e descobriu uma anotação de R$ 74,77, datada de 16 de junho de 2025, vinculada a um suposto contrato que dizia nada ter assinado. Mais grave: aquela negativação era a mais antiga registrada em seu nome, o que a tornava a origem do bloqueio de crédito. Mesmo assim, ao contatar a empresa indicada, ouviu que só teria o nome limpo se quitasse a dívida.
A fundamentação jurídica
O caso foi levado ao Juizado Especial Cível da Comarca de Manaus, onde a sentença reconheceu que a inscrição era indevida e afrontava o artigo 43, §2º, do Código de Defesa do Consumidor, por ausência de notificação prévia.
O juiz Luiz Pires de Carvalho Neto destacou que, sendo a anotação discutida a mais antiga, não cabia invocar a Súmula 385 do STJ, que veda indenização quando já existem registros anteriores legítimos. No caso, inexistia débito anterior, razão pela qual a empresa, o Boticário, deveria responder integralmente pelos danos causados.
A decisão também reforçou a responsabilidade objetiva do fornecedor prevista no artigo 14 do CDC: ainda que se alegasse fraude, cabia à empresa prevenir o uso indevido de dados pessoais. O dano moral foi reconhecido como presumido (in re ipsa), dispensando prova específica do prejuízo.
A condenação
A empresa foi compelida a excluir o registro e condenada a indenizar a consumidora em R$ 5 mil por danos morais. Os juros deverão incidir desde a data da inscrição, conforme a Súmula 54 do STJ, e a correção monetária a partir da citação.
O episódio mostra como uma dívida de valor ínfimo e sequer reconhecida pode travar o acesso ao crédito, gerar constrangimento social e expor a fragilidade do consumidor frente a grandes empresas. A Justiça, ao analisar a peculiaridade da negativação mais antiga, reafirmou que práticas negligentes não podem ser normalizadas, razão de ser da condenação por danos morais.
Processo n. 0171995-32.2025.8.04.1000
