Pentágono chama de ‘provocação’ sobrevoo de caças venezuelanos.
O episódio que elevou o tom da crise entre Washington e Caracas ganhou contornos de caso jurídico internacional. A explosão de um barco supostamente usado para o transporte de drogas, ordenada por forças americanas no Caribe e que resultou em 11 mortos, abriu debate sobre os limites do uso da força em águas internacionais e a linha tênue entre operações de segurança e execuções extrajudiciais.
O Pentágono classificou como “altamente provocador” o sobrevoo de aviões militares venezuelanos contra um navio da Marinha americana, dias após a ofensiva. Em nota pública, advertiu o governo Nicolás Maduro a não interferir nas chamadas “operações de combate ao narcotráfico e contraterrorismo”. Caracas, por sua vez, acusou Washington de “assassinato sem devido processo legal” e mobilizou seu Exército contra o que chamou de “maior ameaça em 100 anos ao continente”.
Uso da força fora de guerra declarada
A Carta das Nações Unidas, em seu artigo 2º, §4º, proíbe o uso da força fora das hipóteses de legítima defesa ou de autorização do Conselho de Segurança. Para especialistas, a destruição do barco, sem prova de ameaça imediata e sem autorização internacional, pode configurar violação ao direito internacional. A narrativa americana tenta enquadrar o narcotráfico como ameaça à segurança global, mas juristas alertam para o risco de transformar operações policiais em atos de guerra.
Narcotráfico e “narcoterrorismo”
O secretário de Estado, Marco Rubio, afirmou que cartéis venezuelanos como o “Tren de Aragua” e o “Cartel de los Soles” foram designados como “organizações narcoterroristas” pelo governo Trump. Com isso, embarcações suspeitas poderiam ser tratadas como alvos militares. Essa doutrina, no entanto, é contestada: sem reconhecimento de conflito armado, o uso de força letal pode ser lido como execução sumária.
Direitos humanos e precedentes internacionais
A Corte Interamericana de Direitos Humanos já condenou Estados por execuções extrajudiciais em operações de segurança, como no Caso Zambrano Vélez vs. Equador. Para a Corte, a mera suspeita de ilícito não elimina a obrigação estatal de respeitar o direito à vida e às garantias processuais. Assim, a acusação venezuelana encontra respaldo em tratados como o Pacto de San José da Costa Rica, que proíbe privação arbitrária da vida.
Escalada e risco jurídico-político
Ao mesmo tempo em que defende a eliminação física de traficantes como única medida eficaz, Rubio deixou claro que aliados regionais devem “ajudar a explodi-los, se necessário”. A retórica aproxima a chamada “guerra às drogas” da lógica de conflito armado internacionalizado, o que obrigaria os Estados a observar as regras do direito humanitário — proporcionalidade, distinção de alvos e proteção a não combatentes.