Passageiros têm direito de ser informados com antecedência mínima e de receber assistência material quando o voo é cancelado ou alterado. Devem ser oferecidas alternativas como reacomodação, reembolso integral ou transporte por outra modalidade, a critério do consumidor. A omissão quanto a essas providências caracteriza falha na prestação do serviço e enseja reparação civil.
Com base nessa premissa, o Juizado Especial Cível de Manaus julgou procedente ação movida contra a TAM Linhas Aéreas S.A., ao reconhecer a ilegalidade no cancelamento unilateral de voo Guarulhos–Manaus, originalmente marcado para a data pretendida pelo passageiro e remarcado para o dia seguinte, sem aviso prévio ou tampouco a assistência devida.
A juíza Luciana da Eira Nasser observou que a empresa não comprovou motivo legítimo para o cancelamento e descumpriu os deveres de informação e amparo material, ao não ofertar as alternativas previstas na regulação da aviação civil. Essas obrigações, destacou a magistrada, decorrem de normas de observância obrigatória, fixadas pela Resolução nº 400/2016 da ANAC, que impõe ao transportador o dever de comunicar alterações com antecedência mínima de 72 horas e de garantir ao passageiro assistência compatível com o tempo de espera — incluindo facilidades de comunicação, alimentação e hospedagem.
Risco da atividade e fortuito interno
A decisão afastou a alegação de “readequação de malha aérea” como justificativa para a alteração do voo. Segundo o juízo, tais circunstâncias integram o risco normal da atividade empresarial, configurando fortuito interno e não excludente da responsabilidade civil. Com base no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, reconheceu-se a responsabilidade objetiva da transportadora, bastando a prova do defeito do serviço e do dano experimentado.
“O cancelamento de voo sem o devido aviso prévio comprova o pouco compromisso da ré com a pontualidade, impondo ao passageiro o desconforto da espera e a angústia de não saber quando se chegará ao destino”, assinalou a magistrada.
Dano moral in re ipsa e caráter pedagógico da reparação
O juízo considerou configurado o dano moral presumido, decorrente do desamparo e da incerteza vivenciada pelo consumidor, e fixou indenização de R$ 5 mil, em valor considerado proporcional à gravidade do episódio e adequado ao caráter punitivo e pedagógico da medida. Determinou, ainda, o ressarcimento de despesas referentes a gastos com alimentação, com atualização pelo IPCA e juros pela taxa Selic.
Precedentes e consolidação jurisprudencial
A sentença citou precedente da 3ª Turma Recursal do TJAM (Proc. nº 0631154-90.2019.8.04.0015, rel.ª juíza Irlena Leal Benchimol), segundo o qual a “reestruturação da malha aérea” não configura caso fortuito externo, reafirmando a obrigação de indenizar mesmo em situações operacionais. O entendimento local converge com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que reconhece o dever de reparar em casos de cancelamento ou atraso superior a quatro horas, sem adequada comunicação e assistência (AgInt no AREsp 1575918/RS, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze).
Efetividade e acesso à Justiça
Ao final, a juíza destacou que o microssistema dos Juizados Especiais concretiza o princípio da efetividade do acesso à Justiça, permitindo a tutela célere e acessível dos direitos do consumidor diante de grandes prestadores de serviço. A decisão, segundo ela, tem também função preventiva, ao reforçar o dever das companhias aéreas de observar as regras administrativas que asseguram previsibilidade e respeito aos usuários do transporte aéreo.
Processo n. 0270498-88.2025.8.04.1000
