Condenações por tráfico com até 40g ou seis plantas fêmeas serão reavaliadas entre 30 de junho e 30 de julho; outras prisões também entram na revisão. O entendimento é que mais de 30% das condenações envolveram pequenas quantidades de drogas.
Em cumprimento à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que estabeleceu critérios objetivos para distinguir o tráfico do porte de maconha para uso pessoal, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) inicia, no próximo dia 30 de junho, um mutirão inédito para revisar a situação de pessoas presas com até 40 gramas ou seis plantas fêmeas da droga.
A força-tarefa — que envolve todos os tribunais estaduais e regionais federais — integra o plano nacional “Pena Justa” e deverá alcançar casos julgados nos últimos oito anos.
A medida decorre do julgamento histórico realizado pelo STF em junho de 2024, que resultou na fixação de parâmetros para a aplicação do art. 28 da Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006). O entendimento, com repercussão geral reconhecida, visa conter distorções judiciais que vinham convertendo usuários em traficantes sem critérios claros, especialmente nas periferias urbanas.
Conforme a Portaria CNJ nº 167/2025, os tribunais têm até 26 de junho para identificar os processos que se encaixam nos critérios fixados. A análise se concentrará em casos com penas já aplicadas por tráfico de drogas, cujos réus tenham sido detidos exclusivamente com maconha, em quantidade inferior ao novo limite, sem porte de outras substâncias ou indícios típicos de comercialização.
Impacto social e a revisão da política criminal
A medida ocorre em meio ao agravamento da crise penitenciária brasileira, cuja inconstitucionalidade foi reconhecida pelo STF em 2023. O mutirão representa o primeiro esforço coordenado do plano “Pena Justa”, que pretende reduzir o encarceramento indevido e garantir o respeito aos direitos fundamentais de pessoas presas.
Estudos preliminares do próprio CNJ indicam que, em diversos estados, mais de 30% das condenações por tráfico envolvem apreensões inferiores a 50g, muitas sem outros elementos característicos da mercancia. A ausência de distinção entre usuário e traficante tem alimentado a superlotação e ampliado a seletividade penal — atingindo, majoritariamente, jovens negros e pobres.
Outros três temas também serão alvo de revisão
O mutirão também abordará outras frentes com grande impacto no sistema carcerário:
Gestantes e mães presas: será verificado o cumprimento da decisão do STF no HC coletivo nº 143641/DF (2018), que determinou a substituição da prisão preventiva por domiciliar para mulheres gestantes, puérperas, lactantes, mães de crianças de até 12 anos ou de pessoas com deficiência. Segundo a Resolução CNJ nº 369/2021, essa medida tem caráter nacional e obrigatório, salvo em casos excepcionais com decisão fundamentada.
Prisões preventivas excessivamente longas: processos em que a prisão preventiva já ultrapassou um ano também serão revistos, com base no princípio do prazo razoável e na jurisprudência do STF e STJ contra o prolongamento desnecessário de prisões provisórias.
Execuções penais com pena vencida ou prescrita: será feita uma varredura no Sistema Eletrônico de Execução Unificado (SEEU) para identificar e extinguir penas já cumpridas ou atingidas pela prescrição.
Fiscalização e alinhamento institucional
Para garantir a efetividade da iniciativa, o CNJ convocará representantes dos tribunais a uma reunião de alinhamento na próxima semana. Também será disponibilizado o Caderno de Orientações do Mutirão, com diretrizes práticas e modelos padronizados para facilitar a atuação conjunta dos magistrados, defensores públicos, promotores e servidores do Judiciário.
A previsão é que os resultados consolidados da ação sejam divulgados até outubro de 2025, com levantamento nacional sobre o número de pessoas beneficiadas e impactos diretos sobre a população carcerária.