O Conselho Nacional de Justiça iniciou um levantamento nacional para mapear quais verbas indenizatórias pagas a magistrados podem ser consideradas legítimas e quais configuram distorções remuneratórias.
O estudo é conduzido sob a presidência do ministro Edson Fachin, também presidente do Supremo Tribunal Federal, e deve ser apresentado ao plenário do CNJ em 2026.
A proposta parte de um diagnóstico já conhecido: benefícios classificados como indenizatórios — e, por isso, fora do teto constitucional — passaram a funcionar, em muitos casos, como mecanismo de ampliação permanente da remuneração, sem descontos tributários e com impacto direto nos cofres públicos.
A intenção do CNJ é estabelecer critérios objetivos que diferenciem indenizações vinculadas a despesas efetivas de pagamentos considerados abusivos, além de avaliar a criação de um teto específico para esse tipo de verba.
Entre os exemplos apontados como potencialmente legítimos estão as gratificações por acúmulo de função — quando um magistrado responde por mais de uma unidade jurisdicional — e o pagamento de diárias vinculadas a deslocamentos institucionais. Já benefícios reconhecidos de forma administrativa, sem respaldo judicial definitivo, estão no centro do escrutínio.
O tema foi destacado por Fachin no discurso de encerramento do ano judiciário, quando afirmou que a discussão sobre a remuneração da magistratura será prioridade de sua gestão. Segundo o ministro, o desafio é compatibilizar a valorização da carreira com a necessidade de conter excessos. “Transparência é a chave quanto às modalidades de remuneração”, afirmou. “O respeito à dignidade da magistratura deve caminhar na mesma medida da contenção de abusos.”
O movimento ocorre em um contexto de crescente pressão institucional e social sobre os chamados supersalários no Judiciário e no Ministério Público. Em maio deste ano, o CNJ aprovou resolução que veda o reconhecimento e pagamento de novos benefícios por decisão exclusivamente administrativa, exigindo, para isso, trânsito em julgado de ação coletiva ou precedente qualificado dos tribunais superiores.
Apesar disso, entidades especializadas em transparência avaliam que a medida tem alcance limitado, por não enfrentar benefícios já incorporados nem fechar completamente as brechas que permitem pagamentos acima do teto constitucional. A expectativa é que o novo estudo avance sobre esse ponto sensível — ainda que enfrente resistência de associações representativas da magistratura.
O antecessor de Fachin na presidência do Supremo, ministro Luís Roberto Barroso, já havia defendido publicamente que cabe ao Legislativo definir, com precisão, quais verbas podem ultrapassar o teto de forma excepcional, e extinguir aquelas concedidas sem base legítima. O diagnóstico agora retorna ao centro da agenda institucional, sob a promessa de maior racionalidade e controle.
Se o levantamento resultará em mudanças efetivas ou apenas em novos parâmetros interpretativos, ainda é uma incógnita. Mas o simples reconhecimento, pelo órgão de controle do Judiciário, de que o modelo atual produz distorções já recoloca o tema no campo das decisões estruturais — onde o debate deixa de ser corporativo e passa a ser republicano.
