A exigência de estudos consistentes e de participação efetiva das comunidades potencialmente afetadas constitui premissa básica do licenciamento ambiental. Quando essas etapas são suprimidas ou executadas de modo incompleto, o ato administrativo perde a presunção de legitimidade e pode ser suspenso judicialmente.
Com esse fundamento, o Ministério Público Federal no Pará ajuizou ação civil pública para anular ou suspender a Licença de Operação (LO nº 1.684/2025) concedida pelo Ibama à Petrobras para perfuração exploratória do Bloco FZA-M-59, na Margem Equatorial brasileira.
Segundo o MPF, a licença foi emitida apesar de “falhas técnicas substanciais” no processo de avaliação ambiental do empreendimento. A petição inicial, assinada por procuradores do Grupo de Apoio ao Núcleo Povos da Floresta, do Campo e das Águas (GAPOVOS), sustenta que a área de influência da operação foi mal delimitada, deixando de identificar municípios, comunidades e povos tradicionais diretamente afetados.
O órgão argumenta que a ausência dessa caracterização impede qualquer estimativa real dos impactos da atividade de perfuração, tanto sobre o ambiente marinho quanto sobre a pesca artesanal e o modo de vida das populações costeiras.
A ação destaca ainda que não houve estudo de desembarque pesqueiro, etapa considerada indispensável para aferir a pressão sobre estoques, rotas de navegação, dinâmica socioeconômica das comunidades e riscos de perdas materiais e culturais.
Para o MPF, os dados apresentados pela Petrobras são “contraditórios, desatualizados e insuficientes para suportar a emissão de licença ambiental”, além de ignorarem pesquisas recentes desenvolvidas por universidades federais da região. Além disso, o Ministério Público afirma que faltaram os estudos de componentes indígenas, quilombolas e tradicionais, indispensáveis para identificar vulnerabilidades e medir impactos cumulativos, especialmente em uma zona considerada sensível pelo próprio Ministério do Meio Ambiente.
Outro ponto levantado é a ausência de consulta prévia, livre e informada (CPLI), obrigatória segundo a Convenção 169 da OIT. Para o MPF, o Ibama não poderia ter emitido a licença antes de assegurar que as comunidades potencialmente afetadas fossem devidamente consultadas sobre riscos, alternativas e medidas mitigatórias. A petição afirma que, ao condicionar a consulta a fases posteriores, o processo de licenciamento “esvazia o próprio sentido da participação social”, já que a perfuração exploratória gera impactos imediatos e irreversíveis.
O Ministério Público pede ao Judiciário que suspenda a eficácia da licença até que novos estudos sejam realizados, incluindo revisão da área de influência, novo diagnóstico socioambiental, estudo de desembarque pesqueiro, pesquisa completa sobre comunidades tradicionais, estudo de impacto climático e a realização da consulta prévia. A ação também menciona episódios anteriores em que licenças na Margem Equatorial foram negadas por incapacidade das empresas em demonstrar plano de resposta adequado a emergências ambientais, o que reforçaria a necessidade de cautela.
O processo aguarda apreciação do pedido liminar pela Justiça Federal no Pará.
