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Justiça rejeita ANPP e mantém curso da ação penal contra blogueira considerada foragida

Foto: Divulgação

A Justiça do Amazonas rejeitou a homologação de um Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), em favor da blogueira Rosa Ibere Tavares Dantas, em ação por homicídio culposo no trânsito que resultou na morte do personal trainer Talis Roque da Silva, no Vieiralves, em agosto de 2023. Na decisão, o juízo apontou ilegalidades no acordo e ausência de requisitos legais.

Em decisão judicial na ação penal nº 0683986-06.2023.8.04.0001, que tramita na 10ª Vara Criminal da Comarca de Manaus, o juiz Áldrin Henrique de Castro Rodrigues, rejeitou a homologação de um Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) proposto pelo Ministério Público do Amazonas em favor da blogueira Rosa Ibere Tavares Dantas, denunciada por crime de trânsito (art. 302 do CTB).

Com a decisão o processo seguirá seu curso regular com a intimação das partes, que terão o prazo de 05 (cinco) dias para apresentarem suas alegações finais e, após isso, os autos serão conclusos para sentença.

Segundo a decisão o ANPP apresentado “não atende às exigências formais e materiais” para sua validação, além de afrontar princípios processuais essenciais; ignora sanções obrigatórias e não assegura a finalidade preventiva e repressiva da resposta penal.

A Decisão cita, ainda, precedente do Superior Tribunal de Justiça, que confirma ser possível ao juiz recusar homologação quando o acordo não cumpre exigências legais, especialmente quanto à reparação do dano.

O processo n.º 0683986-06.2023.8.04.0001 segue disponível para o público, visto que foi negado o segredo de justiça pedido pela defesa.

Motivos da recusa do acordo
Entre os motivos para a recusa do ANPP está a mudança de posicionamento do Ministério Público sem fato novo relevante, preclusão lógica e processual, ausência de requisitos legais para o acordo (como confissão válida e reparação do dano), e a omissão de sanções legais aplicáveis.

De acordo com os autos o MPAM, inicialmente, afirmou que o ANPP não era cabível, porém, depois do fim da instrução do processo, outro promotor apresentou o ANPP sem qualquer fato novo que explicasse a mudança. Para o magistrado, essa alteração tardia fere a preclusão lógica, compromete a segurança jurídica e viola os princípios de unidade e indivisibilidade do Ministério Público.

O juízo se fundamenta em uma série de fatos que invalidam a adoção da medida com base na “conduta processual incompatível” da ré.

A decisão lembra que no início do processo a Superintendência da Polícia Federal informou que a acusada deixara o Brasil com destino a Paris, antes mesmo de ser citada. Apesar disso, a defesa constituída nos autos seguiu fornecendo supostos endereços na comarca de Manaus, o que induziu o juízo a engano e atrasou o andamento do caso por quase um ano.

Ao constatar que a ré havia saído do país e estava residindo na Europa “com destino incerto e não sabido”, o juiz determinou a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão. No entanto, conforme registrado nos autos, nenhuma delas foi cumprida, demonstrando “desprezo deliberado pelas ordens judiciais”.

A sequência de descumprimentos levou à decretação da prisão preventiva da acusada, cujo mandado permanece ativo no Banco Nacional de Mandados de Prisão (BNMP). Com isso, a Justiça a considera foragida.

Na decisão, o magistrado ressalta que, diante das circunstâncias, a análise da suficiência do ANPP deixa de ser uma questão de mérito e passa a envolver requisito de legalidade. “Homologar um acordo com quem se recusa a se submeter à jurisdição nacional seria esvaziar por completo o requisito de suficiência imposto pelo legislador”, afirma na Decisão.

Proposta para a família
Entre outras situações, a ANPP propõe, a título de reparação de dano, o pagamento de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) em favor dos pais da vítima, além de uma prestação pecuniária de 10 (dez) salários mínimos. “Nesse contexto, a cláusula referente à reparação do dano mostra-se manifestamente ilegal e insuficiente, implicando verdadeira revitimização da família e comprometendo substancialmente um dos principais requisitos materiais para a celebração válida do Acordo de Não Persecução Penal“, afirma a Decisão.

Confissão considerada inválida e sem boa-fé
Outro requisito não atendido foi a “confissão formal e válida” do delito, exigida pelo caput do art. 28-A. A confissão apresentada, segundo o juiz, é “destituída de boa-fé” e contraditória em relação ao comportamento processual da ré ao longo de todo o processo.

ANPP não incluiu sanções à ré
O crime imputado à ré, previsto no art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro, estabelece, em seu preceito secundário, a pena de “detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor”, mas o Acordo de Não Persecução Penal apresentado não prevê essa determinação ou qualquer outra medida restritiva a altura.

Fonte: TJAM