Recurso questiona alcance da tutela provisória e invoca a LINDB para afastar ordens judiciais que esgotam o mérito da ação civil pública sobre a pandemia
Uma decisão judicial que determinou a adoção de medidas de reparação e memória institucional em razão das mortes ocorridas na crise de oxigênio medicinal durante a pandemia da Covid-19, no Amazonas, é objeto de recurso no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1).
O processo tem origem em Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM), que pedem a responsabilização dos entes federativos por falhas na gestão da emergência sanitária e a implementação de ações voltadas à reconstrução da memória pública da tragédia
O juízo de primeira instância acolheu parte da pretensão, determinando que os entes federativos, União, Estados e Município de Manaus, coletem e publiquem dados oficiais elaborem programas de atenção às vítimas e instituam cursos internos sobre boas práticas em emergências sanitárias. As medidas foram fundamentadas na ideia de “justiça de transição sanitária”, voltada à prevenção de novas tragédias e ao resgate da memória institucional.
Contestação: tutela provisória e separação de competências
O recurso apresentado sustenta que a decisão liminar extrapola os limites da tutela provisória prevista no artigo 300 do CPC, por antecipar o mérito da ação e impor obrigações de execução imediata que dependem de planejamento, orçamento e coordenação interfederativa.
A peça recursal invoca o artigo 1º, §3º, da Lei 8.437/1992, que veda a concessão de medidas liminares que esgotem, total ou parcialmente, o objeto da ação em processos contra a Fazenda Pública. Argumenta também que parte das providências determinadas — como a coleta de dados e a apuração de responsabilidades — são de atribuição primária dos órgãos estaduais e federais de saúde, e não poderiam ser exigidas isoladamente de um ente local.
O recurso enfatiza a necessidade de aplicação do artigo 22 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), que impõe aos julgadores o dever de considerar “os obstáculos e as dificuldades reais do gestor público” e os impactos práticos das decisões sobre políticas estatais.
Sob esse prisma, sustenta-se que o cumprimento imediato das medidas fixadas “poderia comprometer a legalidade orçamentária e gerar prejuízos à continuidade de políticas públicas essenciais”. O argumento se ancora no consequencialismo jurídico, segundo o qual o controle judicial de políticas públicas deve ponderar os efeitos concretos das decisões sobre a governança administrativa.
ACP n° 1011497-89.2024.4.01.3200