A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) se prepara para enfrentar presencialmente uma das discussões mais sensíveis envolvendo a modulação de efeitos em recursos repetitivos: a limitação temporal da tese que afastou o teto de 20 salários mínimos como base de cálculo das contribuições parafiscais destinadas ao custeio do Sistema S (Sesi, Senai, Sesc e Senac).
O caso em exame
Dois embargos de divergência foram apresentados pela Fazenda Nacional contra acórdãos proferidos sob o rito dos repetitivos. O ponto central é a alegada irregularidade na modulação definida pela 1ª Seção do STJ, que condicionou a aplicação da nova orientação a marcos temporais específicos.
Os recursos ficaram a cargo dos ministros Og Fernandes e Maria Thereza de Assis Moura. No REsp 1.898.532, Og admitiu os embargos para julgamento colegiado. Já no REsp 1.905.870, Maria Thereza os rejeitou liminarmente, sob o argumento de inexistência de divergência. A Fazenda interpôs agravo interno, que chegou a ser pautado virtualmente, mas foi retirado após pedido de destaque do ministro Francisco Falcão.
A tendência é que ambos os casos sejam julgados em conjunto pela Corte Especial. O cenário, no entanto, já se mostra desfavorável à Fazenda: enquanto o agravo tramitava no ambiente virtual, sete ministros acompanharam a relatora pelo indeferimento dos embargos.
A modulação dos efeitos
A 1ª Seção do STJ havia considerado existir jurisprudência dominante favorável ao teto de 20 salários mínimos, com base em dois precedentes colegiados e cerca de 13 anos de decisões monocráticas no mesmo sentido.
Assim, modulou os efeitos da tese: somente as empresas que ajuizaram ação ou protocolaram pedido administrativo até 25 de outubro de 2023 (data em que se iniciou o julgamento dos repetitivos) e obtiveram decisão favorável puderam manter o recolhimento limitado; esse regime, porém, valeu apenas até 2 de maio de 2024, data da publicação do acórdão da 1ª Seção.
Nos embargos, a Fazenda sustenta que decisões isoladas de turma ou monocráticas não configuram jurisprudência dominante. Segundo seu entendimento, apenas julgamentos colegiados uníssonos da própria seção, ou em ambas as turmas que a compõem, seriam suficientes para fundamentar a modulação.
Problema concorrencial e judicialização preventiva
O recorte temporal acabou gerando distorções no mercado. Empresas que tinham ação ou pedido administrativo em curso puderam usufruir do limite de 20 salários mínimos por três anos e quatro meses — desde a afetação do tema em dezembro de 2020 até a publicação do acórdão em maio de 2024. Concorrentes, entretanto, ficaram impedidas de gozar do mesmo benefício em razão da suspensão dos processos determinada pela sistemática dos repetitivos.
O critério aplicado pela 1ª Seção foi mantido quando contribuintes tentaram, por embargos de declaração, ampliar a modulação para todas as entidades do Sistema S.
O debate expõe um efeito colateral que preocupa ministros e especialistas: a tendência de judicialização preventiva. Empresas passaram a buscar ações antecipadamente, mesmo antes da formação definitiva de tese, como forma de se resguardar diante de futuras modulações.