Se o agente pratica a receptação no exercício de sua atividade comercial ou profissional, basta um único ato para configurar a forma qualificada do crime (art. 180, §1º, CP), pois a lei presume que, ao utilizar a estrutura do comércio, o agente amplia o risco social e confere aparência de licitude a bens de origem criminosa, sendo desnecessária a prova de habitualidade.
A Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Amazonas decidiu que a prática da receptação no exercício de atividade comercial configura a forma qualificada do delito, ainda que não haja prova de habitualidade. Para o colegiado, o simples fato de o comerciante se valer da estrutura de seu estabelecimento já é suficiente para conferir aparência de licitude a bens de origem criminosa, ampliando o risco social da conduta.
Caso em exame
O processo envolveu um mecânico condenado por adquirir, em sua oficina, peças de uma motocicleta furtada. A defesa buscava a desclassificação da conduta para receptação simples, alegando que não havia comprovação de prática reiterada.
Questão em discussão
O debate concentrou-se em saber se a lei exige habitualidade para a incidência da qualificadora prevista no artigo 180, §1º, do Código Penal, ou se basta a prática do ato no contexto de atividade comercial.
Razões de decidir
Para o relator, desembargador Jorge Manoel Lopes Lins, a materialidade e a autoria estavam comprovadas por depoimentos policiais prestados em juízo, coerentes com os demais elementos de prova. O voto destacou ainda a confissão do acusado em fase policial, quando afirmou que “sempre aparecem compradores interessados” em peças, evidenciando a dinâmica comercial.
O magistrado frisou que a finalidade da qualificadora é punir com maior rigor quem, utilizando-se da atividade profissional, fomenta o comércio de bens ilícitos. Nessa perspectiva, não se exige a prova de habitualidade, pois o exercício da atividade comercial, ainda que irregular, confere ao produto de crime uma aparência de legalidade.
Dispositivo e tese
Por unanimidade, a Câmara Criminal negou provimento à apelação e manteve a condenação.
Tese firmada:
“Se o agente pratica a receptação no exercício de sua atividade comercial ou profissional, basta um único ato para configurar a forma qualificada do crime (art. 180, §1º, CP), pois a lei presume que, ao utilizar a estrutura do comércio, o agente amplia o risco social e confere aparência de licitude a bens de origem criminosa, sendo desnecessária a prova de habitualidade.”
Processo n. 0232106-74.2022.8.04.0001
