Pai adotivo em relação homoafetiva conquista licença-maternidade após adoção de menor de 14 anos

Pai adotivo em relação homoafetiva conquista licença-maternidade após adoção de menor de 14 anos

A Justiça do Trabalho de Minas Gerais reconheceu o direito à licença-maternidade de 120 dias a um trabalhador em relação homoafetiva que adotou um adolescente de 14 anos de idade. A decisão é dos julgadores da Primeira Turma do TRT-MG, que acompanharam o voto da juíza convocada Adriana Campos de Souza Freire Pimenta, como relatora, e mantiveram a sentença oriunda da 13ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, garantindo a indenização substitutiva pelo benefício não concedido.

O trabalhador, técnico de enfermagem, provou que, junto ao companheiro, obteve termo de guarda para fins de adoção. Apesar da comunicação formal ao hospital empregador, o pedido de afastamento de 120 dias não foi aceito. A instituição, por sua vez, alegou que o direito à licença-maternidade, no caso de adoção, só se aplica a crianças de até 12 anos. Como o adolescente adotado já tinha 14 anos de idade, o benefício não seria aplicável, na visão do hospital empregador.

Ao examinar o recurso, a relatora rejeitou o argumento do empregador com base no artigo 392-A da CLT, que regula a questão da adoção e da guarda judicial para fins de concessão da licença-maternidade. “O entendimento que prevalece é de que o benefício será pago, durante 120 dias, a qualquer um dos adotantes, sem ordem de preferência, inclusive nas relações homoafetivas. No entanto, será concedido apenas um salário-maternidade para cada adoção, ainda que ambos se afastem do trabalho para cuidar da criança.”, registrou a magistrada.

A relatora destacou ainda que, em março de 2024, no julgamento do RE 1211446, o STF reconheceu a licença-maternidade para mães não gestantes nos casos de união estável homoafetiva. Conforme a tese fixada e que deverá ser aplicada a todos os processos semelhantes, se uma das mães usufruir da licença-maternidade de 120 dias, a companheira terá direito a um período equivalente à licença-paternidade de cinco dias.

Foi citada, na decisão, a fala do ministro Luiz Fux, relator do processo no STF. Segundo ele, embora não esteja expressamente previsto em lei, o Supremo deve garantir o cumprimento da Constituição quanto à proteção à criança. Para o ministro, a mãe não gestante também tem direito à licença: “A licença também se destina à proteção de mães adotivas e de mãe não gestante em união homoafetiva, que, apesar de não vivenciarem as alterações típicas da gravidez, arcam com todos os demais papéis e tarefas que lhe incumbem após a formação do novo vínculo familiar“.

O voto condutor da relatora também citou os fundamentos da sentença. Além do artigo 392 da CLT, o juiz de primeiro grau mencionou o artigo 72 da Lei 8.213/1991, que prevê que “o salário-maternidade para a segurada empregada ou trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual à sua remuneração integral“. Também foi citado o artigo 227, parágrafo 6º, da Constituição, que veda qualquer tipo de discriminação entre filhos biológicos e adotados.

Segundo a sentença, desde 2015, o Supremo Tribunal Federal reconhece a possibilidade de adoção por parte de casais homoafetivos, a chamada adoção homoparental. Nesses casos, apenas um dos adotantes tem direito ao salário-maternidade, cabendo ao outro o auxílio-paternidade, conforme também ocorre com casais heteroafetivos.

O argumento do hospital de que o direito seria somente para adotantes de crianças de até 12 anos foi rejeitado. A decisão destacou que a Convenção sobre os Direitos das Crianças, ratificada pelo Brasil e incorporada ao ordenamento jurídico pelo Decreto nº 99.710/1990, considera como criança toda pessoa com menos de 18 anos de idade.

O direito não está ligado necessariamente a questões biológicas, como amamentação, mas ao melhor benefício da criança, que, principalmente nos primeiros meses, carece de uma presença maior dos pais para se adaptar à nova vida, novo lar e nova realidade, o que é ainda mais difícil para os menores que passam pela puberdade, que, notoriamente, é um momento da vida em que podem aflorar emoções bastante turbulentas”, registrou a sentença. O juízo de primeiro grau também destacou que cabe ao casal, e não ao empregador, a escolha de quem irá usufruir do benefício, sendo garantido ao outro o direito ao auxílio-paternidade.

Como a licença-maternidade não foi concedida ao trabalhador no momento oportuno, a condenação se deu na forma de indenização substitutiva. O pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho também foi acolhido.

Paternidade contemporânea: afeto, diversidade e transformação

O mundo moderno testemunhou o surgimento de um novo conceito de paternidade. Longe da imagem rígida do pai exclusivamente provedor, hoje se reconhece que ser pai é, acima de tudo, estar presente com afeto, escuta e responsabilidade emocional. Essa transformação acompanha mudanças sociais profundas, especialmente no reconhecimento da diversidade familiar e das relações homoafetivas como espaços legítimos de amor e cuidado.

Na paternidade contemporânea, o vínculo afetivo supera qualquer modelo tradicional. Pais de diferentes orientações sexuais, identidades de gênero e formações familiares têm demonstrado que o amor, o compromisso e a dedicação não têm uma única forma. Casais homoafetivos que decidem construir uma família enfrentam desafios únicos, mas também protagonizam histórias inspiradoras de acolhimento, respeito e construção de laços sólidos.

Esses pais muitas vezes precisam lidar com preconceitos sociais e barreiras legais, mas também são agentes de mudança, mostrando que a paternidade não está atrelada a um padrão único, e sim à capacidade de cuidar, educar e amar. Em famílias homoafetivas, a presença paterna pode se manifestar em dupla, com dois pais que compartilham igualmente as responsabilidades e alegrias da criação dos filhos, oferecendo modelos de masculinidade mais sensíveis, empáticos e plurais.

A diversidade familiar amplia o entendimento sobre o que significa ser pai. Ela desafia estereótipos e convida a sociedade a reconhecer que o essencial na formação de uma criança não é o formato da família, mas a qualidade das relações que a sustentam. Pais que se dedicam, que acolhem, que educam com afeto — independentemente de sua orientação sexual — são fundamentais para um futuro mais inclusivo.

A paternidade, nesse novo cenário, deixa de ser um papel fixo e passa a ser uma vivência moldada pelo amor, pela presença e pela coragem de romper com padrões ultrapassados. E é justamente nessa pluralidade que reside a beleza da paternidade moderna: ela é diversa, transformadora e profundamente humana.

Com informações do TRT-3

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