A cobrança de juros remuneratórios muito acima da média de mercado por instituições financeiras pode ser considerada abusiva, ensejando revisão contratual e repetição do indébito.
Foi com esse fundamento que a Justiça do Amazonas condenou a Crefisa S/A – Crédito, Financiamento e Investimento em ação revisional ajuizada por uma consumidora, decisão que foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) e posteriormente teve o recurso especial da instituição financeira inadmitido pelo Ministro Herman Benjamin, do STJ.
Segundo os autos do processo nº 0786788-19.2022.8.04.0001, a autora firmou contrato de empréstimo pessoal com a Crefisa, no valor de R$ 1.894,05, a ser pago em 12 parcelas de R$ 458,90. A taxa de juros pactuada foi de 22% ao mês e 987,22% ao ano.
A sentença da 10ª Vara Cível de Manaus, proferida pela juíza Mônica Cristina Raposo da Câmara Chaves do Carmo, considerou a taxa manifestamente superior à média praticada na época da contratação — de 4,88% ao mês e 77,05% ao ano — conforme divulgado pelo Banco Central do Brasil.
A magistrada aplicou a jurisprudência do STJ consolidada no REsp 1.061.530/RS, julgado sob o rito dos repetitivos, segundo a qual a revisão judicial dos juros remuneratórios é admitida nas relações de consumo quando a abusividade estiver cabalmente demonstrada.
A sentença declarou a abusividade dos juros, afastou a mora da parte autora, determinou a readequação da taxa ao patamar médio do mercado e a devolução dos valores pagos a maior, com correção monetária e juros de mora. O pedido de indenização por danos morais foi julgado improcedente, por ausência de violação aos direitos da personalidade.
Ambas as partes interpuseram apelação. A Terceira Câmara Cível do TJAM, com voto condutor do Desembargador Domingos Jorge Chalub Pereira, manteve a revisão do contrato, reconhecendo a hipossuficiência da consumidora e a exorbitância da taxa contratual, superior em mais de 1.180% à média de mercado. Contudo, reformou parcialmente a sentença apenas para reconhecer a repetição dos valores em dobro, diante da ausência de justificativa plausível para a cobrança abusiva, nos termos do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.
Insatisfeita, a Crefisa interpôs recurso especial ao STJ, que foi inadmitido por decisão da Vice-Presidência do TJAM. Ao analisar o agravo em recurso especial (AREsp 2935693/AM), o Ministro Herman Benjamin destacou que a instituição financeira não impugnou especificamente todos os fundamentos da decisão agravada, incidindo o óbice da Súmula 7/STJ, que veda o reexame de provas, e da Súmula 83/STJ, que impede recurso especial contra acórdão alinhado à jurisprudência dominante do Tribunal.
Com base no art. 21-E, V, c/c art. 253, parágrafo único, I, do Regimento Interno do STJ, o relator não conheceu do recurso da Crefisa, consolidando a condenação da instituição por prática abusiva na contratação de empréstimo.
NÚMERO ÚNICO:0004194-55.2023.8.04.0000