A utilização de medidas executivas atípicas para localizar bens do devedor exige observância estrita aos princípios da proporcionalidade, subsidiariedade e adequação, especialmente quando envolvem acesso a sistemas concebidos para fins penais.
Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça vedou a consulta ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) em execução de título extrajudicial, por considerá-la incompatível com a natureza do processo civil. O caso foi relatado pelo Ministro Humberto Martins.
O colegiado, por unanimidade, deu provimento parcial ao recurso especial interposto pelo Banco Modal, apenas para autorizar a expedição de ofício ao Banco Central do Brasil, restrita à consulta ao Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional (CCS), afastando, contudo, qualquer possibilidade de acesso ao Coaf ou ao sistema Simba.
Execução frustrada e pedido de aprofundamento investigativo
No caso, a instituição financeira alegou o esgotamento das diligências executivas ordinárias, como Infojud, Renajud e BacenJud (atual SisbaJud), e requereu o aprofundamento da investigação patrimonial dos devedores, sustentando que haveria indícios de blindagem e esvaziamento de bens.
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro havia negado tanto a consulta ao Banco Central quanto ao Coaf, por entender que tais providências extrapolariam o escopo da execução cível e demandariam indícios de ilícito penal. Contra essa decisão, o banco recorreu ao STJ.
Natureza cadastral do CCS permite consulta
Relator do recurso, o ministro Humberto Martins fez distinção entre os sistemas pretendidos. Segundo ele, a consulta ao CCS do Banco Central é admissível porque possui natureza meramente cadastral, limitando-se a indicar vínculos do devedor com instituições financeiras, sem acesso a saldos, valores ou movimentações, o que afasta a caracterização de quebra de sigilo bancário.
Nesse ponto, o relator destacou que impedir o acesso ao CCS, após o esgotamento de medidas típicas, comprometeria a efetividade da execução e o princípio do resultado.
Coaf e Simba são instrumentos penais, afirma Turma
Em relação ao Coaf e ao Simba, o entendimento foi oposto. Para o STJ, ambos são instrumentos vocacionados à persecução penal, voltados à prevenção e repressão à lavagem de dinheiro e outros ilícitos, e seu uso para satisfação de crédito privado representaria desvio de finalidade e mitigação desproporcional do sigilo bancário.
O voto ressaltou que a Constituição e a Lei Complementar 105/2001 só autorizam a quebra de sigilo para investigação criminal, instrução penal ou hipóteses legalmente previstas, o que não se confunde com a busca patrimonial em execução cível.
Limite às medidas atípicas
A 3ª Turma reafirmou que o art. 139, IV, do CPC não legitima qualquer providência executiva, devendo o juiz avaliar, caso a caso, se a medida é necessária, proporcional e compatível com o interesse público envolvido.
Ao final, o colegiado concluiu que a efetividade da execução não autoriza a instrumentalização de órgãos de inteligência financeira para fins privados, mantendo hígida a separação entre os âmbitos civil e penal.
