O sistema prisional, como expressão do Estado, deve operar sob os ditames da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da não discriminação, valores garantidos como cláusulas pétreas pela Constituição Federal de 1988.
Esse foi o entendimento da juíza Laryssa Angélica Copack Muniz, da Vara de Execuções Penais de Curitiba, para ordenar que a Casa de Custódia de Curitiba autorize a entrada de uma mulher negra que tentou visitar o sobrinho e foi barrada por estar usando tranças.
A autora procurou a Defensoria Pública. Na ação, o defensor público Henrique Camargo Cardoso, responsável pelo caso, argumentou que as tranças não podem ser equiparadas a próteses, vedadas em visitas pelas regras do Departamento de Polícia Penal do Paraná.
A tia é a única familiar próxima do homem custodiado, que foi criado por ela depois que sua mãe morreu. A Lei de Execução Penal diz que as pessoas presas têm direito à visita do cônjuge, da companheira, de parentes ou amigos em dias determinados. A legislação brasileira ressalta ainda que as unidades penais devem estimular a manutenção e a melhora das relações entre a pessoa presa e sua família.
Ao analisar o caso, a juíza apontou que a restrição, longe de ser apenas uma questão de segurança, revela um juízo de valor indevido sobre a aparência da visitante. “A estética do cabelo da mulher negra é cultural, simbólica e, acima de tudo, histórica. É parte de um processo de afirmação identitária em uma sociedade que, por muito tempo, tentou negar às pessoas negras o direito de existir em sua plenitude”, registrou.
A julgadora sustentou que é preciso reconhecer que determinadas práticas institucionais, embora sejam formalmente neutras, podem produzir efeitos discriminatórios quando aplicadas sem levar em conta o contexto social.
“Trata-se, aqui, de compreender que o sistema de justiça, inclusive o sistema penitenciário, deve ser permanentemente convocado a revisar seus próprios mecanismos, sob pena de, ainda que involuntariamente, reproduzir exclusões estruturais”, pregou a juíza.
Por fim, ela determinou a emissão de credencial de visitas em favor da autora da ação para que ela possa visitar o sobrinho na prisão.
Processo 0000258-88.2025.8.16.0009
Com informações do Conjur