Justiça anula justa causa e condena agropecuária por assédio sexual de supervisor

Justiça anula justa causa e condena agropecuária por assédio sexual de supervisor

adotou medidas previstas na Lei da Cipa para prevenir assédio, descumprindo o dever de garantir ambiente seguro às mulheres

Uma auxiliar de classificador de grãos que atuava na região de Sapezal teve reconhecido o direito à indenização por danos morais e à reversão da demissão por justa causa, após comprovar que foi vítima de assédio sexual e agressão física no ambiente de trabalho. A decisão é da Vara do Trabalho de Campo Novo do Parecis, que reconheceu a negligência da empresa e fixou a indenização em R$ 30 mil.

A sentença concluiu que a dispensa foi injusta e ocorreu após a empregada denunciar o comportamento abusivo do supervisor. Ao julgar o caso, a juíza Graziele de Lima afirmou que o assédio sexual, agravado pela agressão física e pela demissão por justa causa, “gera evidente sofrimento e aflição psicológica com repercussão na intimidade, na vida privada e profissional, na honra e na imagem da trabalhadora”.

A empresa alegou que a dispensa ocorreu porque a funcionária mantinha um relacionamento amoroso com o agressor. Afirmou ainda que não houve assédio e que só tomou conhecimento da relação após a agressão. Segundo a defesa, a orientação da empresa é para que os empregados evitem intimidades no ambiente de trabalho, conforme previsto no regimento interno.

Contratada em janeiro de 2023, a auxiliar foi dispensada em março de 2024, dias após um episódio de agressão envolvendo seu superior. Em depoimento à Justiça, ela negou qualquer relacionamento amoroso com o supervisor. Contou que chegaram a sair juntos uma vez, como amigos, mas ao perceber comportamentos ciumentos e agressivos, recusou qualquer envolvimento afetivo.

A partir disso, passou a ser alvo de perseguições, “brincadeiras” com conotação sexual e tentativas de aproximação física, que a constrangiam. Segundo o relato, mesmo com as recusas, o supervisor — valendo-se da posição hierárquica — mantinha a trabalhadora sob vigilância constante e demonstrava ciúmes em relação aos demais colegas. Ela afirmou que chegou a relatar o assédio ao encarregado geral da empresa, mas nenhuma medida foi tomada.

A situação culminou em um episódio de agressão, em março de 2024. Enquanto auxiliava outros colegas em uma tarefa, a pedido de outro superior, foi abordada pelo supervisor, que demonstrou ciúmes ao vê-la próxima a outros empregados. Ao recusar um “abraço”, foi empurrada contra a parede e teve os braços segurados com força. O ataque foi registrado por câmeras e confirmado por exame de corpo de delito, que apontou hematomas. Pouco tempo depois, ela foi dispensada por justa causa.

A sentença concluiu que a dispensa foi injusta e ocorreu após a empregada denunciar o comportamento abusivo do supervisor. Ao julgar o caso, a juíza Graziele de Lima afirmou que o assédio sexual, agravado pela agressão física e pela demissão por justa causa, “gera evidente sofrimento e aflição psicológica com repercussão na intimidade, na vida privada e profissional, na honra e na imagem da trabalhadora”.

Para a magistrada, o vídeo e as demais provas confirmam a versão da trabalhadora, além de evidenciar a omissão da empresa diante das denúncias. Ela destacou que a agressão física ocorreu no contexto do assédio e que as provas demonstram que ela ocorreu em razão de ciúmes do supervisor.

Programa Emprega + Mulheres

Conforme ressaltou a juíza, é dever do empregador adotar medidas para assegurar um ambiente de trabalho seguro e saudável. Essa obrigação, prevista na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), foi reforçada pela Lei 14.457/2022, conhecida como Lei da CIPA, que instituiu o Programa Emprega + Mulheres. A norma determina a adoção de políticas de prevenção e combate ao assédio sexual e a outras formas de violência no trabalho, com o objetivo de promover a inserção e a permanência das mulheres no mercado.

A legislação estabelece uma série de ações voltadas à igualdade de gênero, incluindo a flexibilização de jornadas, criação de canais de denúncia, capacitação de equipes e divulgação de regras de conduta nas empresas. A decisão judicial ressalta que a empresa não comprovou o cumprimento de nenhuma dessas medidas, como exige a legislação.

A magistrada entendeu que a empresa agiu com negligência e deve ser responsabilizada. Ela lembrou que a responsabilidade também se estende de forma objetiva (independentemente de culpa) quando os atos são praticados por prepostos, conforme previsto no Código Civil. “Assim, sob qualquer prisma que se analise a questão, a reclamada é responsável pelos danos sofridos pela parte autora”, afirmou.

Com base no Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a magistrada aplicou a inversão do ônus da prova quanto à alegação de assédio sexual. No entanto, a empresa não apresentou comprovação do cumprimento das exigências da Lei da CIPA, tampouco demonstrou a existência do relacionamento amoroso que alegava justificar a demissão por justa causa.

A juíza também ponderou que as fotos anexadas ao processo não eram suficientes para provar um vínculo afetivo entre a trabalhadora e o supervisor. “As imagens retratam apenas um determinado momento, e o fato de a vítima eventualmente ceder às investidas do assediador não descaracteriza o assédio sexual”, destacou. Uma testemunha ouvida no processo reforçou esse entendimento ao afirmar que, “na empresa e para os demais funcionários, ninguém sabia se ambos tinham algum tipo de relacionamento”.

Reversão da Justa Causa

Diante das provas e da ausência de medidas preventivas por parte da empresa, a magistrada concluiu que não era possível justificar a demissão por justa causa com base em uma suposta relação afetiva. “Não tendo a empresa tomado medidas para evitar o assédio, tampouco para receber e apurar denúncias, não pode simplesmente demitir a autora sob alegação, sem provas robustas, de que mantinha relacionamento com o agressor”, finalizou.

A sentença condenou a agropecuária a pagar as verbas rescisórias à ex-empregada, incluindo aviso prévio, 13º salário e férias proporcionais, multa de 40% sobre o FGTS e a multa pelo atraso na quitação dessas verbas. Também determinou a expedição de guias para saque do FGTS e habilitação no seguro-desemprego.

Por se tratar de decisão de primeiro grau, cabe recurso ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT/MT).

PJe 0000839-79.2024.5.23.0111

Com informações do TRT-23

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