Embora o artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor garanta ao consumidor o direito de desistir do contrato no prazo de sete dias, essa prerrogativa aplica-se exclusivamente às contratações realizadas fora do estabelecimento comercial — como em vendas pela internet, por telefone ou no sistema porta a porta —, quando o consumidor não tem contato direto com o produto ou serviço em ambiente controlado.
No caso concreto, como a contratação ocorreu presencialmente na sede da instituição, essa regra não se aplicaria de forma automática. Ainda assim, o juiz Francisco Carlos Gonçalves de Queiroz, do Juizado Cível em Tabatinga, no Amazonas, considerou que, diante do não início do curso e da comunicação prévia de cancelamento, a retenção total dos valores pagos afrontou os princípios da boa-fé contratual e do equilíbrio nas relações de consumo.
Quando o consumidor solicita o cancelamento de um serviço antes do início de sua prestação, é dever do fornecedor agir com lealdade, transparência e razoabilidade, definiu o magistrado julgando procedente a ação movida por um aluno que teve negado o reembolso da quantia de R$ 2.500,00, paga pela matrícula em curso que sequer foi iniciado.
A sentença destaca que, embora não tenha sido comprovada a contratação fora do estabelecimento comercial — condição que atrairia diretamente o direito de arrependimento previsto no art. 49 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) —, a ausência de prestação do serviço aliada à solicitação prévia de cancelamento afasta a legalidade da retenção total do valor pago.
Segundo o magistrado, a conduta da empresa, a Academia Manauara Formação Vigilantes, violou o princípio da boa-fé objetiva (art. 422 do Código Civil) e resultou em enriquecimento sem causa, vedado pelo art. 884 do mesmo código.
A Academia foi citada nos autos, mas não apresentou contestação dentro do prazo legal, sendo declarada revel. A ausência de defesa reforçou a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor, conforme o art. 344 do Código de Processo Civil.
Além de não comprovar que o curso havia sido iniciado ou que houve qualquer despesa específica com a matrícula, a requerida tampouco apresentou cláusula contratual prevendo multa por desistência. Ainda assim, negou o reembolso, mesmo após o preenchimento de formulário específico fornecido por ela mesma e diversas tentativas de contato por parte do consumidor.
Para o juiz, essa conduta extrapolou o mero inadimplemento contratual e violou deveres anexos como lealdade e cooperação, gerando frustração e angústia ao aluno. Por isso, fixou,também, a indenização por dano moral em R$ 5.000,00, com correção monetária e juros.
Autos nº. 0603190-19.2024.8.04.7300