O fato de a companhia aérea fornecer hospedagem, alimentação e suporte básico ao passageiro afetado por cancelamento de voo — como exige a Resolução 141/2010 da ANAC — não afasta o dever de indenizar por danos morais. Esses auxílios representam apenas o mínimo legal, mas não eliminam a frustração, o atraso excessivo, a perda de compromissos e o impacto direto que a interrupção inesperada da viagem causa ao consumidor.
Por isso, explica a magistrada, o dano moral nesses casos é presumido (in re ipsa): basta o passageiro experimentar o cancelamento e seus efeitos para que o prejuízo imaterial esteja configurado, independentemente de prova específica.
A sentença também reforça que problemas técnicos e manutenções não programadas constituem fortuito interno, ou seja, situações previsíveis e inerentes à própria atividade de transporte aéreo. Nesses casos, não se reconhece força maior capaz de afastar a responsabilidade objetiva prevista no Código de Defesa do Consumidor.
O caso
A passageira retornava ao Brasil pelo voo Latam quando recebeu a informação de que a aeronave não decolaria em razão de “manutenção emergencial não programada”. A solução oferecida pela companhia aérea levou a um atraso superior a 19 horas para que ela chegasse ao destino final (Manaus/AM).
A empresa alegou que a falha técnica configuraria caso fortuito ou força maior, pretendendo afastar sua responsabilidade. Também afirmou ter prestado toda a assistência material regulamentar.
Nenhuma dessas teses foi acolhida pela juíza Jaci Cavalcanti Gomes Atanazio, titular do 16º Juizado Especial Cível de Manaus. Na sentença, a magistrada destacou a relação de consumo e a responsabilidade objetiva da companhia aérea (arts. 2º, 3º e 14 do CDC); a inexistência de prova capaz de demonstrar força maior ou evento externo à atividade; a jurisprudência pacífica do STJ que classifica problemas técnicos como fortuito interno, portanto indenizável; a obrigatoriedade das assistências previstas pela ANAC, que não eliminam o dano moral; a perda de compromisso profissional relevante pela passageira.
Segundo a juíza, “não se pode olvidar o elevado grau de frustração e inconformismo gerado sobre um passageiro que se vê impedido de prosseguir viagem, permanecendo na cidade até que um novo e incerto embarque seja efetivado”.
Indenização
Com base nesses fundamentos, a empresa foi condenada ao pagamento de R$ 6.000,00 por danos morais, com atualização pela SELIC a partir da data da sentença.
Processo n.: 0209444-24.2025.8.04.1000
