Desvio de verbas da saúde repassadas “fundo a fundo” deve ser julgado pela Justiça Estadual, fixa STF

Desvio de verbas da saúde repassadas “fundo a fundo” deve ser julgado pela Justiça Estadual, fixa STF

O Supremo Tribunal Federal decidiu, em definitivo, que cabe à Justiça Estadual processar e julgar crimes de desvio de verbas públicas da saúde repassadas automaticamente pela União aos estados, na modalidade “fundo a fundo”. O caso tem origem em uma das ações penais derivadas das investigações sobre o Instituto Novos Caminhos, entidade privada no centro da Operação Maus Caminhos, deflagrada pela Polícia Federal no Amazonas para apurar supostos desvios de recursos do Fundo Nacional de Saúde (FNS).

A decisão, proferida pela Segunda Turma do STF, foi unânime e relatada pelo ministro Nunes Marques, que manteve acórdão do TRF1 reconhecendo a incompetência da Justiça Federal para julgar o processo nº 0000867-98.2018.4.01.3200, até então em trâmite na 4ª Vara Federal da Seção Judiciária do Amazonas. A decisão foi publicada aos 16.10.2025.

O caso teve origem em investigação contra ex-gestores do Estado do Amazonas, acusados de integrar organização criminosa responsável pelo desvio de recursos destinados a políticas públicas de saúde. Os valores, segundo o Ministério Público Federal, provinham de repasses federais vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS) e ao Fundeb, utilizados em contratos com o Instituto Novos Caminhos.

A ação penal tramitava na 4ª Vara Federal da Seção Judiciária do Amazonas, sob o nº 0000867-98.2018.4.01.3200, até que o TRF1, ao julgar habeas corpus, reconheceu a ausência de interesse jurídico da União, uma vez que as verbas haviam sido transferidas automaticamente e incorporadas ao patrimônio estadual, sem convênio ou qualquer obrigação de prestação de contas ao governo federal. O Ministério Público Federal recorreu ao Supremo, sustentando que a origem federal dos recursos bastaria para atrair a competência da Justiça Federal.

Fundamento do STF

Ao negar provimento ao agravo, o ministro Nunes Marques destacou que o art. 109, IV, da Constituição exige interesse jurídico direto da União para fixar a competência federal — o que não ocorre quando os recursos são repassados de forma automática, regular e definitiva. Citou ainda precedentes da Corte, como os habeas corpus 233.205 (Rel. Min. Gilmar Mendes) e a Ação Originária 2.093 (Rel. Min. Cármen Lúcia), ambos reafirmando que, após a incorporação das verbas ao orçamento estadual, o controle e a responsabilização cabem à Justiça local.

O voto também se apoiou em manifestações do Tribunal de Contas da União (TCU) e do Tribunal de Contas do Estado do Amazonas (TCE-AM), que haviam afastado a existência de vínculo jurídico entre os recursos do Fundo Nacional de Saúde e as despesas executadas pelo Instituto Novos Caminhos.

Encerramento e contextualização

Com a decisão, o STF consolida jurisprudência segundo a qual a mera origem federal dos recursos não define competência da Justiça Federal, resguardando o pacto federativo e a autonomia financeira dos entes subnacionais na execução de políticas públicas.

O acórdão, assinado digitalmente e disponível no portal do Supremo sob o código A898-1355-37FD-957C, reforça o entendimento de que a descentralização do SUS não gera, por si só, interesse jurídico da União nos crimes relacionados à aplicação local dos recursos. No caso concreto, os autos foram encaminhados à Justiça Estadual do Amazonas. 

RE 1529208 AgR
Órgão julgador: Segunda Turma
Relator(a): Min. NUNES MARQUES

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