Um negócio imobiliário de grande porte, no qual os próprios compradores reconhecem a intenção de investimento, não deve ser tratado como uma relação consumerista. O contrato entre as partes, nesse caso, é de natureza civil e empresarial, o que impede que seja analisado à luz do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Esse foi o entendimento do juiz André Frederico de Sena Horta, 3ª Vara Cível de Barueri (SP), para declarar a validade de um contrato de compra de 14 unidades de um empreendimento hoteleiro.
Duas pessoas investiram cerca de R$ 2 milhões para adquirir os imóveis com a intenção de alugá-los para turistas. Posteriormente, quando já deviam mais de R$ 300 mil em parcelas e taxas, os autores pediram a rescisão contratual com base em supostas irregularidades nos tanques de armazenamento de óleo diesel dos geradores, o que acarretaria risco de explosão e obrigação de pagamento de adicional de periculosidade aos empregados da obra.
Os investidores afirmaram que isso comprometeria o investimento, porque implicaria em um acréscimo de 30% no pagamento dos empregados e levaria à desvalorização do imóvel.
As empresas rés disseram que o local era regularizado e seguro, além de pontuarem que a relação ali era de investimento e, assim, não caberia o uso das normas do CDC. Além de rejeitarem a anulação do contrato, as empresas entraram com um pedido de reconvenção para cobrar os R$ 300 mil devidos pelos autores.
Foi pedida uma perícia de engenharia para avaliar se existia um problema nas instalações dos geradores. O laudo apontou que não havia irregularidades.
Rescisão x resilição
O juiz avaliou ser necessário diferenciar entre os institutos da rescisão contratual, que era formalmente pedido pelos autores, e o da resilição, que era o que eles buscavam na prática.
A resilição é a extinção do contrato por manifestação de vontade, representando um direito de arrependimento ou desistência, sem necessariamente haver um motivo que justifique o desfazimento do negócio. Já a rescisão contratual é uma forma de extinção do contrato baseada em circunstância preexistente à formação do contrato ou decorrente de um vício genético daquele contrato, a exemplo de um vício construtivo, tal como alegado pela parte autora.
O magistrado disse não existir prova técnica para amparar a alegação da parte autora. “Ao contrário, a prova pericial é conclusiva quanto à regularidade das instalações e à segurança do empreendimento. Logo, não há que se falar em culpa das rés ou em descumprimento contratual que justifique a rescisão pleiteada”.
Para o juiz, ficou evidente o “desejo” dos investidores de terminar o contrato “por mera desistência”, mas “essa desistência imotivada não foi expressamente formulada na petição inicial, que se baseou na alegação de vícios construtivos”.
“No caso em análise, não foi previsto o direito de arrependimento; ao contrário, as partes expressamente afastaram essa possibilidade ao preverem a irrevogabilidade e irretratabilidade do contrato”, seguiu e determinou não haver “fundamento jurídico” para o pedido. Dessa forma, os investidores continuam no contrato e precisam pagar os R$ 300 mil devidos às construtoras.
Processo 1006615-52.2018.8.26.0068
Com informações do Conjur