STJ reconhece que a reiteração das agressões e o trauma psicológico justificam o aumento da pena-base por refletirem maior reprovabilidade da conduta e consequências que ultrapassam o previsto no tipo penal.
O Superior Tribunal de Justiça manteve a condenação de um homem por lesão corporal praticada contra a companheira, reconhecendo a legitimidade do aumento da pena-base em razão da reiteração das agressões e do abalo psicológico sofrido pela vítima. Para o relator, ministro Antonio Saldanha Palheiro, esses elementos ultrapassam o conteúdo típico do crime previsto no artigo 129, §13, do Código Penal e revelam maior reprovabilidade da conduta, legitimando a exasperação da pena.
Fundamentação e contexto do caso
O réu foi condenado a dois anos de reclusão, em regime aberto, pelo 4º Juizado Especializado no Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Manaus. A sentença fixou a pena-base um ano acima do mínimo legal, destacando que as agressões ocorreram na presença dos filhos e geraram danos psicológicos relevantes à vítima, que precisou de acompanhamento terapêutico.
O Tribunal de Justiça do Amazonas manteve a condenação, mas concedeu a suspensão condicional da pena (sursis) e reduziu o valor da indenização de dez para cinco salários-mínimos. O acórdão, porém, entendeu equivocadamente que a pena havia sido fixada no mínimo legal, sem observar os fundamentos concretos da sentença.
Entendimento do STJ
Ao analisar o recurso especial, a defesa alegou violação ao artigo 59 do Código Penal e pediu a aplicação da pena mínima. O ministro Antonio Saldanha Palheiro, no entanto, considerou que a sentença havia apresentado motivação idônea para o aumento da basilar, ressaltando a reiteração e a intensidade das agressões, bem como as consequências psicológicas do crime.
O relator também apontou um equívoco técnico do Tribunal de origem quanto à aplicação da lei penal no tempo. O TJAM utilizou a redação do art. 129, §13, introduzida pela Lei 14.994/2024, que prevê pena de 2 a 5 anos, quando o crime fora praticado ainda sob a vigência da Lei 14.188/2021, que estabelecia pena de 1 a 4 anos. Assim, a pena-base de 2 anos não correspondia ao mínimo legal, mas refletia um aumento devidamente fundamentado dentro dos parâmetros da lei vigente à época do fato.
O relator destacou ainda que a defesa não impugnou de forma específica esses fundamentos nem buscou sanar o erro do TJAM por meio de embargos de declaração, apresentando argumentos genéricos. Diante disso, aplicou as Súmulas 282, 356 e 284 do Supremo Tribunal Federal, que tratam da ausência de prequestionamento e da deficiência de fundamentação recursal, conhecendo do agravo apenas para não conhecer do recurso especial.
Relevância jurídica
A decisão reforça que, na dosimetria da pena, a culpabilidade e as consequências do crime podem ser legitimamente valoradas de forma negativa quando as circunstâncias fáticas demonstram maior gravidade do que a já prevista no tipo penal. Também reafirma a necessidade de fundamentação concreta para a exasperação da pena e a importância de impugnação específica pela defesa, sob pena de preclusão.
O precedente se insere na jurisprudência do STJ que reconhece o abalo psicológico e a reiteração de condutas violentas como elementos aptos a justificar a majoração da pena em crimes de violência doméstica.
AREsp 2997766
