O Supremo Tribunal Federal suspendeu o julgamento da ação que discute a constitucionalidade de Lei 6.528/2013, do estado do Rio de Janeiro, que proíbe o uso de máscaras em protestos.
O julgamento, que trata de regras para atos públicos, acontecia no Plenário virtual da corte e foi interrompido nesta sexta-feira (19/12) por um pedido de vista da ministra Cármen Lúcia.
A ação teve repercussão geral definida em agosto de 2016 (Tema 912). Na ocasião, o relator do processo, ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que a repercussão geral no caso envolve a discussão sobre os limites da liberdade de manifestação do pensamento e de reunião.
O agora ministro aposentado ressaltou ainda que a questão não trata apenas da vedação ao anonimato (inciso IV, artigo 5º da Constituição Federal), como também a relação com a segurança pública. Barroso deu como exemplo os chamados “black blocs”— grupo cujos integrantes participam de manifestações utilizando roupas e máscaras pretas — argumentando que “a forma peculiar de manifestação desses grupos, bem como por ações de depredação patrimonial suscitou intensas discussões nos anos recentes.”
A discussão no Judiciário começou quando a lei estadual foi questionada, primeiramente, no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro em ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) apresentadas pelo então Partido da República (PR) e pela seccional fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil. Na ocasião, o TJ-RJ entendeu que a norma era constitucional.
O partido alegou que a lei limitava a liberdade de manifestação do pensamento e introduzia restrições ao direito de reunião previstas constitucionalmente, sendo excessiva e desproporcional. A sigla disse ainda que não havia anonimato quando o manifestante está fisicamente presente na reunião, hipótese em que deve se identificar uma vez abordado pela polícia. A proibição das máscaras, diz o pedido, significa cercear a liberdade de expressão.
Por outro lado, a Procuradoria do Estado do Rio de Janeiro defendeu que o uso de máscaras durante manifestações é uma forma de anonimato vedada pela Constituição, e que o objetivo seria dificultar a atuação policial e fugir à responsabilidade pela prática de atos de vandalismo. O órgão sustenta que seu uso desvirtuaria a natureza pacífica da manifestação, sendo necessária à preservação da segurança pública e destacou que a restrição é igualmente prevista em vários outros países.
Maioria dos ministros defende a proibição
Em voto apresentado no Plenário virtual, o relator destacou a necessidade de interpretação constitucional que harmonize a atuação do poder público com a proteção efetiva dos direitos fundamentais. No entendimento de Barroso, a Constituição consagrou a dignidade da pessoa humana como um de seus pilares, o que impõe ao Estado não apenas deveres negativos — de não violar direitos —, mas também obrigações positivas, voltadas à implementação de políticas públicas capazes de assegurar condições mínimas de existência digna à população.
O ministro ressaltou que a atuação administrativa deve observar critérios de razoabilidade, proporcionalidade e finalidade pública, afastando práticas arbitrárias ou desproporcionais que possam comprometer direitos individuais ou coletivos. Segundo Barroso, o controle judicial é legítimo sempre que houver violação a parâmetros constitucionais, especialmente quando estejam em jogo direitos fundamentais.
O voto também abordou a relação entre separação de Poderes e jurisdição constitucional. Para o relator, o Judiciário não invade a esfera dos demais Poderes ao exigir o cumprimento da Constituição, mas exerce sua função institucional de guarda da ordem constitucional. Nesse sentido, destacou que a deferência às escolhas administrativas não pode servir de escudo para omissões estatais incompatíveis com o texto constitucional.
Por fim, o magistrado deu provimento ao recurso, declarando a constitucionalidade da lei do Rio de Janeiro e propondo a seguinte tese para o Tema 912:
É constitucional lei estadual que veda o uso de máscaras ou de peças que cubram o rosto dos cidadãos em manifestações populares, salvo se a utilização ocorrer por razões culturais ou de saúde pública.
Até o momento votaram os ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Dias Toffoli e André Mendonça acompanhando o relator e o ministro Edson Fachin divergindo.
ARE 905.149
Tema 912
Com informações do Conjur
