A Justiça do Amazonas considerou abusiva a prática de envio de boletos bancários sob a justificativa de “proposta de serviços”, quando estes aparecem diretamente no Débito Direto Autorizado (DDA) — sistema destinado a registrar cobranças reais.
A decisão do Juiz Antônio Carlos Marinho Bezerra, do Juizado Cível, condenou a empresa emissora a indenizar em R$ 3 mil por danos morais um estabelecimento comercial da capital, além de impor a obrigação de cessar os envios.
O caso
O processo teve origem após a empresa consumidora receber, durante meses, boletos no valor de R$ 619,80, lançados em sua conta corrente, que somaram quase R$ 2,5 mil, embora nunca tivesse contratado qualquer serviço. Mesmo após notificação extrajudicial para interromper a prática, as cobranças continuaram sendo enviadas ao sistema bancário.
A defesa
Em contestação, a ré alegou que os boletos não tinham caráter coercitivo, mas sim de “boletos-proposta”, facultativos, acompanhados de carta explicativa. Sustentou que não houve inscrição em órgãos de proteção ao crédito e que, portanto, não havia dano moral indenizável, apenas aborrecimento corriqueiro. Chegou a citar precedentes do STJ que afastam indenizações em hipóteses de envio isolado de boletos.
O fundamento judicial
O juiz Antonio Carlos Marinho Bezerra Júnior, em decisão, definiu que o caso era o de cobranças indevidas. Para ele, admitir que os boletos eram meras propostas significava reconhecer a inexistência de vínculo contratual. Assim, a utilização do DDA, criado para facilitar a gestão de dívidas reais, como veículo de propostas comerciais foi considerada desvio de finalidade e prática abusiva.
O magistrado aplicou ainda a teoria do desvio produtivo do consumidor, ao reconhecer que o tempo despendido pelo estabelecimento para monitorar cobranças indevidas e evitar pagamentos equivocados configurou lesão indenizável, ultrapassando o mero dissabor.
A decisão
A sentença declarou a inexistência de relação jurídica entre as partes, determinou o cancelamento das cobranças já emitidas e proibiu a ré de enviar novos boletos, sob pena de multa diária de R$ 200 limitada a R$ 5 mil. Além disso, condenou ao pagamento de R$ 3 mil por danos morais, corrigidos pela taxa Selic, afastando a alegação de enriquecimento sem causa.
Contexto
A decisão reforça o entendimento de que, ainda sem negativação, a insistência em lançar cobranças pelo DDA sem respaldo contratual não pode ser tolerada. O julgamento evidencia que a tese de mero aborrecimento não se sustenta quando há prática reiterada e utilização de sistemas bancários em desacordo com sua finalidade.
Processo 0097977-40.2025.8.04.1000