Poderes em atrito: Decisão de Gilmar Mendes sobre blindagem de Ministros acirra a crise

Poderes em atrito: Decisão de Gilmar Mendes sobre blindagem de Ministros acirra a crise

A disputa por espaço institucional entre Legislativo, Executivo e Judiciário atingiu um dos pontos mais tensos dos últimos anos. O pano de fundo é a separação dos Poderes — princípio estruturante do constitucionalismo brasileiro — que voltou ao centro do debate após decisão monocrática do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, limitando quem pode apresentar pedido de impeachment contra integrantes da Corte. O movimento foi interpretado no Congresso como uma intervenção em prerrogativas do Senado e abriu nova fase de atrito entre os Poderes.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), reagiu com um discurso duro no plenário, afirmando que o Legislativo não aceitará esvaziar sua competência constitucional. Para ele, a decisão de Mendes — que atribuiu exclusivamente ao procurador-geral da República a legitimidade para apresentar pedidos de impeachment de ministros — rompe uma escolha do legislador histórico, prevista desde a Lei do Impeachment, de 1950. Alcolumbre defendeu a aprovação de nova lei para redefinir os crimes de responsabilidade dos membros do STF e sugeriu alteração constitucional para reverter os efeitos da decisão. “Não nos faltará coragem para fazer o que for necessário para proteger o Legislativo brasileiro”, afirmou, sob aplausos de parlamentares de diferentes espectros políticos.

A reação ocorre em meio a outros embates recentes. A Câmara já sinalizou que não deverá cumprir automaticamente as decisões do STF sobre perda de mandato da deputada Carla Zambelli (PL-SP) — condenada e atualmente presa na Itália — e do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ). A postura indica que a Casa pretende submeter as ordens ao crivo interno da CCJ antes de qualquer deliberação, acentuando o cenário de contestação institucional. Paralelamente, o Senado enfrenta sua própria crise com o Palácio do Planalto após resistir à indicação de Lula ao STF, em movimento que foi interpretado pelo governo como tentativa da Casa de influenciar diretamente na escolha do próximo ministro.

A decisão de Gilmar Mendes, no entanto, foi o gatilho mais imediato da crise. Além de transferir ao PGR — hoje, Paulo Gonet — a exclusividade para formular pedidos de impeachment de ministros, o ministro também fixou novo quórum para aprovação: em vez de maioria simples dos votantes, passará a ser necessária maioria qualificada de 54 dos 81 senadores, mesmo padrão exigido para afastar o presidente da República. O objetivo declarado é impedir o uso político dos pedidos, frequentes nos últimos anos, e evitar que divergências interpretativas do STF sejam tratadas como infração constitucional.

A decisão foi tomada em liminar concedida em ação proposta pelo Solidariedade, presidido pelo deputado Paulinho da Força, aliado de ministros da Corte. Inicialmente, o processo versava sobre prisão de candidatos no segundo turno das eleições, mas a discussão foi ampliada para abarcar o tema do impeachment. A votação da liminar está marcada para o plenário virtual do STF entre os dias 12 e 19 de dezembro, período imediatamente anterior ao recesso parlamentar, o que reduz espaço para reações mais contundentes por parte do Congresso.

Diante do cenário, senadores articulam uma PEC para restaurar a legitimidade ampla — inclusive de qualquer cidadão — para apresentar pedidos de impeachment de ministros do STF. A oposição tenta colher assinaturas para protocolar a proposta ainda este ano, embora o rito de tramitação seja mais longo e complexo. Para aliados de Alcolumbre, a liminar enfraquece o Senado ao submeter sua atuação a um filtro inicial do Ministério Público, num momento em que diversos parlamentares são investigados pela Corte em inquéritos relacionados ao uso de emendas parlamentares.

A crise institucional permanece aberta e, embora ainda pendente de julgamento definitivo no STF, já repercute na relação entre os Poderes. A blindagem a ministros, a reação do Senado e a disputa sobre prerrogativas constitucionais reposicionam o conflito entre Legislativo e Judiciário num patamar que desafia o equilíbrio institucional e projeta novos capítulos para as próximas semanas.

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