Gilmar Mendes rejeita reclamação do Município de Óbidos e reafirma que, na ausência de investigação formal ou risco concreto de autoincriminação, o comparecimento de agentes públicos à CPI é obrigação legítima.
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, julgou improcedente a reclamação constitucional apresentada pelo Município de Óbidos (PA) contra decisões do Juízo da Vara Única local que determinaram o comparecimento de secretários municipais e de um servidor público à Comissão Parlamentar de Inquérito instaurada pela Câmara Municipal para apurar supostas irregularidades na contratação de empréstimos pelo Executivo.
A reclamação alegava violação à autoridade das ADPFs 395 e 402, nas quais o STF fixou parâmetros sobre garantias de investigados perante CPIs, especialmente o direito de não se autoincriminar. Segundo o Município, o simples fato de os convocados figurarem como “potenciais investigados” justificaria sua ausência, ainda que o juízo local tivesse reconhecido o direito ao silêncio e à assistência de advogado.
Sem investigação formal, convocação é diligência legítima do Legislativo
Ao examinar os documentos que instruíam a reclamação, Gilmar Mendes concluiu que não havia qualquer demonstração de que os secretários municipais ou o servidor figurassem como investigados formais da CPI. O que existia eram intimações para esclarecimentos administrativos, típicas da atividade fiscalizatória dos Parlamentos.
O relator reafirmou que o art. 58, §3º, da Constituição confere às CPIs poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, o que inclui a prerrogativa de convocar agentes públicos para prestar informações sobre fatos relacionados à atuação administrativa. Nessas circunstâncias, a convocação não constitui abuso nem constrangimento.
Direito ao silêncio não implica direito de não comparecer
O ministro destacou que o juízo de origem já havia resguardado integralmente as garantias constitucionais dos convocados: direito ao silêncio, proteção contra perguntas autoincriminatórias, acompanhamento por advogado. Para o STF, essa proteção é suficiente para afastar qualquer risco de violação aos precedentes das ADPFs 395 e 402.
Gilmar Mendes foi categórico ao assentar que “A condição de potencial investigado não pode ser presumida nem alegada genericamente como fundamento para a desobrigação ao comparecimento.” Assim, o direito ao silêncio não se converte em autorização para faltar. O dever de comparecer permanece, salvo quando houver prova concreta de risco jurídico — o que não se verificou no caso.
Secretários municipais não desfrutam das prerrogativas de chefes do Executivo
O relator também afastou analogias com a recente orientação fixada na ADPF 848, que vedou a convocação de governadores por CPIs do Senado por violação à separação dos Poderes e à autonomia federativa. Segundo ele, tal proteção institucional não se estende automaticamente a secretários municipais, cujas funções e regime de responsabilidade não se equiparam à chefia do Executivo.
Reclamação não substitui recurso e não serve para controle genérico de legalidade
Ao concluir pelo não cabimento da reclamação, Gilmar Mendes reiterou a jurisprudência do STF segundo a qual o instrumento não pode ser utilizado como sucedâneo recursal, tampouco como via para revisão ampla de decisões judiciais ordinárias. Diante da inexistência de afronta à autoridade dos precedentes invocados, o ministro julgou a reclamação totalmente improcedente, com fundamento no art. 21, §1º, do RISTF.
Rcl 87327
Relator(a): Min. GILMAR MENDES



