A regularidade jurídica na contratação de entidades do terceiro setor pelo poder público exige, como requisito essencial, o cumprimento rigoroso das normas que regem a qualificação dessas organizações. Quando tal exigência é descumprida, compromete-se não apenas a validade do contrato, mas também os princípios constitucionais que norteiam a administração pública.
Foi com base nesse entendimento que o Tribunal de Contas do Estado do Amazonas (TCE-AM), por meio de seu Conselheiro Substituto, Mário José de Moraes Costa Filho, concedeu medida cautelar determinando a imediata suspensão do Chamamento Público nº CP01/2025, destinado à contratação do Instituto Nacional de Desenvolvimento Social e Humano (INDSH) para gerir o Hospital e Pronto-Socorro Doutor Aristóteles Platão Bezerra de Araújo.
A decisão decorre de representação apresentada pelo deputado estadual Maurício Wilker, que apontou que o INDSH não possuía, à época da contratação, a necessária qualificação como Organização Social (OS), conforme exigido pela Lei Federal nº 9.637/1998, pela legislação estadual e pelo próprio edital. A ausência de ato formal de qualificação publicado no Diário Oficial do Estado foi considerada vício insanável, apto a comprometer a legalidade do procedimento e ensejar prejuízo potencial ao erário na ordem de R$ 1,45 bilhão.
A decisão monocrática, proferida por conselheiro-substituto do TCE-AM, reconheceu que a ausência de qualificação formal do INDSH como Organização Social — requisito indispensável para a participação no chamamento — violou frontalmente o próprio edital do certame, além das normas que disciplinam a celebração de contratos de gestão com o Estado do Amazonas, como a Lei Estadual nº 3.900/2013 e o Decreto nº 42.086/2020.
Segundo o relator, consulta ao Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), juntada aos autos, demonstrou que o INDSH não possuía qualquer registro de qualificação como OS no período da contratação. Também não foi localizado ato formal publicado no Diário Oficial do Estado conferindo tal status à entidade. Essa ausência foi interpretada como “vício insanável”, que compromete o procedimento desde a origem.
Na análise do pedido cautelar, o relator destacou estarem presentes os dois requisitos exigidos para a concessão da medida: o fumus boni iuris, representado pela plausibilidade jurídica da tese apresentada na representação, e o periculum in mora, caracterizado pelo risco iminente de celebração e execução de contrato milionário com entidade desprovida da necessária habilitação legal.
O valor estimado da contratação — superior a R$ 1,45 bilhão — e a natureza essencial dos serviços de saúde pública envolvidos também foram considerados na ponderação dos riscos. Para o relator, permitir o prosseguimento do certame sem o esclarecimento dessas questões poderia resultar em graves prejuízos ao interesse público e ao erário.
Com base nessas considerações, a decisão determinou a suspensão imediata do Chamamento Público nº CP01/2025 e de todos os atos dele decorrentes, inclusive eventual contrato de gestão, início das atividades e repasse de recursos públicos à entidade, até o julgamento final da representação pelo Pleno do Tribunal.