Uma vez comprovada a cobrança abusiva de juros em um contrato de compra e venda de imóvel, os encargos financeiros excedentes deverão ser descontados do total devido. Com esse entendimento, o juiz José Augusto de Melo Silva, da 31ª Vara Cível de Goiânia, reduziu a dívida de um homem com uma incorporadora em pouco mais de R$ 390 mil.l
No processo, o comprador alegou ter adquirido um imóvel em 2008 por cerca de R$ 150 mil. Como o contrato previa a capitalização mensal de juros, a dívida ultrapassou R$ 600 mil. Ele ajuizou uma ação de revisão de cláusulas contratuais com declaração de inexistência de débito, em que pediu a manutenção da posse do imóvel, a suspensão das cobranças indevidas e a restituição dos valores pagos a mais.
A incorporadora sustentou que houve prescrição decenal porque o contrato foi assinado em 2008 e a ação só foi ajuizada em 2020. A empresa também negou a capitalização mensal. E argumentou que só aplicou o reajuste anual pelo Índice Geral de Preços — Mercado (IGP-M) acrescido de 1% ao mês, conforme a Lei 9.069/95.
Cobrança proibida
Ao analisar o caso, o juiz observou que construtoras e incorporadoras, nos contratos de promessa de compra e venda com pagamento parcelado, submetem-se ao regime geral de juros do Código Civil, que proíbe a capitalização em periodicidade inferior à anual.
“O Código Civil de 2002, em seu artigo 591, veda a prática do anatocismo [cobrança de juros sobre juros]. A Súmula 121 do Supremo Tribunal Federal estabelece que é vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada. O Decreto 22.626/1933 [Lei da Usura], em seu artigo 4º, proíbe contar juros dos juros. O Superior Tribunal de Justiça assentou expressamente que as construtoras e loteadoras não se equiparam às instituições financeiras, razão pela qual não se lhes estende a autorização para capitalização mensal de juros”, assinalou o julgador.
Com base em um laudo pericial que concluiu pela capitalização mensal de juros, o juiz anulou a cláusula que os impôs, determinou a inexigibilidade desses encargos e desconsiderou o atraso das parcelas. O saldo devedor final foi reduzido de R$ 393.077,84 mil para R$ 2.372,94.
O advogado Rafael Bispo da Rocha Filho, do escritório RRF Advogados, defendeu o devedor.
Processo 5272139-95.2020.8.09.0051
Com informações do Conjur
