O Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas iniciou a tramitação de conflito de competência que coloca em debate a aplicação da Lei Maria da Penha após a edição da Lei nº 14.550/2023, em caso envolvendo suposta agressão entre sogra e nora.
O processo opõe a 2ª Vara do Juizado Especial Criminal de Manaus ao 4º Juizado Especializado da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.
O relator, desembargador Ernesto Anselmo Queiroz Chíxaro, adotou postura de cautela institucional ao não antecipar o mérito. Em despacho de 12 de dezembro de 2025, requisitou informações ao juízo suscitado, designou provisoriamente o juízo criminal para apreciação de medidas urgentes e determinou a oitiva do Ministério Público, observando o rito previsto nos arts. 954 a 956 do CPC e no Regimento Interno do TJAM.
Dissenso nasce no Ministério Público
O conflito foi inaugurado a partir de pareceres divergentes do próprio Ministério Público do Amazonas. Em manifestação inicial, a promotoria sustentou que o episódio decorreu de desentendimento familiar sem motivação de gênero, defendendo a remessa ao Juizado Especial Criminal.
Posteriormente, outro parecer ministerial afirmou que, após a Lei nº 14.550/2023, a vulnerabilidade da mulher é presumida nos contextos confirmados pelo art. 5º da Lei Maria da Penha, sendo irrelevante a causa ou a motivação dos atos de violência, o que atrairia a competência do juizado especializado.
Núcleo da controvérsia
No centro do debate está a interpretação do art. 40-A da Lei nº 11.340/2006, incluído em 2023, que estabelece a aplicação da Lei Maria da Penha independentemente da causa ou motivação. De um lado, a leitura restritiva sustenta que a incidência da lei exige demonstração concreta de violência “em razão de gênero”. De outro, a tese ampliativa entende que a violência de gênero é estrutural e presumida quando presentes as relações domésticas, familiares ou íntimas de afeto, conforme precedentes recentes do Superior Tribunal de Justiça.
Providências provisórias e próximo passo
Ao designar o Juizado Especial Criminal para decidir medidas urgentes em caráter provisório, o relator evitou vácuo decisório sem sinalizar competência definitiva. A requisição de informações ao Juizado da Mulher e a nova oitiva do Ministério Público indicam que o TJAM pretende decidir o tema com contraditório institucional completo, diante do impacto orientador que a solução poderá ter na jurisdição de base.
O mérito do conflito será submetido às Câmaras Reunidas, que deverão definir qual leitura prevalece no pós-Lei nº 14.550/2023: a exigência de motivação de gênero ou a presunção normativa de vulnerabilidade nos contextos do art. 5º da Lei Maria da Penha.
Os fatos apontam para desentendimentos no âmbito familiar, com alegação de agressões físicas leves e ofensas verbais ocorridos entre os envolvidos e seguido da apuração policial que deu origem à divergência processual.
Processo nº: 0624009-78.2025.8.04.9001



