A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu, por unanimidade, que o divórcio pode ser decretado liminarmente, mediante julgamento antecipado parcial de mérito, sem necessidade de contraditório. O entendimento foi fixado no Recurso Especial nº 2.189.143/SP, relatado pela ministra Nancy Andrighi e julgado em 18 de março de 2025.
O caso em exame
A ação de origem foi proposta por uma mulher contra o ex-cônjuge, pleiteando divórcio, guarda da filha menor, alimentos e partilha de bens. Ela requereu ainda tutela de evidência para a decretação imediata do divórcio e direito real de habitação sobre o imóvel familiar.
O Tribunal de Justiça de São Paulo havia negado a liminar, entendendo ser imprescindível o contraditório. Também afastou a aplicação do direito real de habitação por analogia ao divórcio.
Questão em discussão
O recurso especial levou ao STJ duas controvérsias principais: Se é necessária a inclusão da filha menor no polo ativo da ação de divórcio. Se é possível decretar o divórcio liminarmente, sem contraditório, pela via da tutela de evidência ou julgamento parcial de mérito.
Além disso, a recorrente defendeu a aplicação análoga do direito real de habitação (art. 1.831 do CC) à hipótese de dissolução conjugal.
Razões de decidir
A ministra Nancy Andrighi destacou que o direito real de habitação é instituto do direito sucessório, voltado a proteger o cônjuge sobrevivente, e não pode ser estendido ao divórcio.
A inclusão da filha no polo ativo é desnecessária, pois a genitora possui legitimidade extraordinária para pleitear alimentos em seu nome, conforme art. 71 do CPC e precedentes da Corte.
Desde a Emenda Constitucional 66/2010, o divórcio é direito potestativo, bastando a manifestação unilateral de vontade de um dos cônjuges para extinguir o vínculo conjugal. O outro apenas se sujeita.
Exigir contraditório para a decretação do divórcio afronta essa natureza potestativa. O tempo do processo não pode ser usado para restringir um direito que se exerce de imediato.
Nesse sentido, a relatora defendeu a aplicação da técnica do julgamento antecipado parcial de mérito (arts. 355 e 356 do CPC), permitindo que o divórcio seja decretado de plano, enquanto os demais pedidos (guarda, alimentos e partilha) seguem instrução probatória.
Dispositivo e tese
O STJ conheceu parcialmente do recurso e, nessa extensão, deu-lhe parcial provimento para decretar o divórcio das partes liminarmente, determinando que a ação prossiga apenas quanto aos consectários (alimentos, guarda e partilha).
A decisão foi unânime na Terceira Turma, acompanhando o voto da relatora.
Fenômeno jurídico
O acórdão consolida a compreensão de que o divórcio imediato é compatível com o modelo processual brasileiro pós-EC 66/2010, afastando formalismos que prolongavam artificialmente a dissolução conjugal. O STJ, ao vincular o instituto ao julgamento parcial de mérito, reconhece que o tempo do processo não pode obstar o exercício de um direito potestativo.
Trata-se de precedente que reforça a tutela da dignidade da pessoa humana e a autonomia privada, marcando uma virada prática para os tribunais de primeira instância, que passam a poder decretar o divórcio liminarmente, mesmo antes de ouvir o outro cônjuge.