A permanência de fios de alta tensão abaixo da altura regulamentar, em desrespeito a normas técnicas de segurança, caracteriza falha na prestação do serviço e impõe responsabilidade objetiva à concessionária de energia elétrica pelos danos decorrentes. Mesmo em caso de suposta imprudência da vítima, a omissão técnica da prestadora afasta o reconhecimento de culpa exclusiva, prevalecendo a teoria do risco administrativo.
A 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas manteve a condenação da Amazonas Distribuidora de Energia S/A por falha na prestação do serviço, após acidente fatal ocasionado por contato entre vegetação cortada no solo e cabo de alta tensão instalado em altura inferior à determinada pela norma ABNT NBR 15688:2009.
A decisão foi unânime, no julgamento da Apelação Cível sob relatoria da desembargadora Onilza Abreu Gerth.
De acordo com os autos, o acidente ocorreu na zona rural de Manaus. Provas documentais e fotográficas demonstraram que a rede de distribuição mantida pela concessionária não observava os parâmetros técnicos mínimos exigidos, o que possibilitou o contato do fio com uma planta de bambu durante corte realizado no nível do solo. O laudo necroscópico atestou como causa da morte a fibrilação ventricular provocada por eletroplessão.
Responsabilidade objetiva e revelia
A concessionária foi regularmente citada por meio do Portal Eletrônico do Tribunal de Justiça, mas permaneceu inerte, sendo declarada revel. Sua tentativa de intervir após a fase instrutória foi considerada intempestiva, não ensejando reabertura da produção probatória, conforme os arts. 344 e 346 do CPC.
A relatora afastou a alegação de culpa exclusiva da vítima, enfatizando que a manutenção da rede em condições irregulares é suficiente para atrair a responsabilidade objetiva da concessionária, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, e do art. 14 do CDC. “Se os fios estivessem na altura correta, o acidente não teria ocorrido”, destacou.
Danos morais e pensão
O colegiado reconheceu o direito à indenização por danos morais a três familiares da vítima direta, incluindo uma enteada, com base em provas de vínculo socioafetivo e na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça quanto ao dano moral reflexo (ricochete). O valor fixado foi de R$ 100 mil por pessoa.
Foi reconhecido também o direito à pensão mensal em favor da companheira e da filha menor da vítima, com base nos rendimentos efetivos da empresa individual por ela mantida. A base de cálculo fixada em sentença foi corrigida, afastando-se o uso do salário mínimo e adotando-se os rendimentos médios comprovados nos autos.
A Corte determinou ainda a constituição de capital pela concessionária para garantir o pagamento da pensão, conforme o art. 533 do CPC e a Súmula 313 do STJ. Após o término da pensão da filha menor, o valor será acrescido à pensão da viúva, em observância à jurisprudência consolidada do STJ.
Os honorários advocatícios foram mantidos no percentual de 20% sobre o valor da condenação, em razão da complexidade da causa e do trabalho processual desenvolvido.