Sentença reconheceu que a instituição que recebe contrato por endosso responde por venda casada de seguro e deve indenizar consumidora.
A Justiça do Amazonas reconheceu que a empresa endossatária de cédula de crédito bancário responde solidariamente por abusos contratuais praticados na origem da operação financeira, ao julgar procedente ação revisional proposta por consumidora contra instituições financeiras. Foram condenadas a Bemol Prestação de Serviços e a BMP Money Plus.
A sentença, proferida pelo juiz Cid da Veiga Soares Júnior, da 1ª Vara Cível e de Acidentes de Trabalho de Manaus, firmou entendimento de que o endosso do título transfere não apenas o crédito, mas também a responsabilidade decorrente de eventual irregularidade na contratação, quando inserida em relação de consumo.
Fenômeno jurídico central: o endosso e a solidariedade na cadeia de consumo
O magistrado iniciou a fundamentação reconhecendo a legitimidade passiva da empresa endossatária, a Bemol Serviços Ltda, rejeitando a preliminar de exclusão. Destacou que, nos termos dos arts. 7º, parágrafo único, e 25, §1º, do Código de Defesa do Consumidor, todos os integrantes da cadeia de fornecimento respondem solidariamente pelos vícios ou falhas na prestação do serviço, de modo que o endosso de título de crédito não rompe o vínculo de consumo, mas o transfere à nova credora.
“Integrando a ré a cadeia de consumo, é parte legítima para figurar no polo passivo da demanda”, registrou o magistrado. O juízo também ressaltou que a responsabilidade civil nas relações de consumo é objetiva, cabendo ao fornecedor demonstrar as excludentes legais — o que não ocorreu no caso. Assim, a empresa que recebe o título por endosso não apenas adquire o direito ao crédito, mas assume o risco do negócio e o dever de responder pelos vícios do contrato que o originou.
Venda casada reconhecida pela imposição de seguro vinculado
No mérito, a decisão concluiu que houve venda casada, prática vedada pelo art. 39, I, do Código de Defesa do Consumidor, em razão da imposição de contratação de seguro com seguradora indicada pela instituição financeira como condição para liberação do empréstimo.
O magistrado aplicou o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo 54, segundo o qual: “O mutuário do Sistema Financeiro da Habitação não pode ser compelido a contratar o seguro habitacional obrigatório com a instituição financeira mutuante ou com a seguradora por ela indicada.”
Embora a contratação do seguro seja obrigatória nas operações de crédito com garantia imobiliária (art. 5º, IV, da Lei nº 9.514/1997), o consumidor deve ter liberdade de escolha quanto à seguradora. No caso, a ausência dessa opção configurou condicionamento ilícito, o que motivou a condenação.
A sentença fixou: Restituição em dobro de R$ 2.505,24, corrigidos pelo IPCA e acrescidos de juros pela taxa SELIC; Danos morais de R$ 5.000,00, com caráter compensatório e pedagógico; Honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação, conforme o art. 85, §2º, do CPC.
O magistrado destacou o duplo caráter da reparação moral — compensar o prejuízo individual e desestimular a repetição de práticas abusivas no mercado financeiro.
Processo n. 0525945-04.2024.8.04.0001