No procedimento do Tribunal do Júri, configura nulidade a utilização, pela acusação ou pela defesa, da decisão de pronúncia como argumento de autoridade para influenciar o convencimento dos jurados, nos termos do art. 478, I, do CPP, impondo-se a anulação da sessão plenária e a realização de novo julgamento.
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, sob relatoria do ministro Rogerio Schietti Cruz, anulou julgamento do Tribunal do Júri no qual o promotor de Justiça, em réplica, afirmou aos jurados que “o juiz que pronunciou e que mandou o réu a júri, manteve a qualificadora da surpresa”. Para o relator, a manifestação ultrapassou a mera referência ao ato processual e constituiu verdadeiro argumento de autoridade, vedado pelo art. 478, I, do Código de Processo Penal.
O caso envolve um condenado pelo homicídio qualificado previsto no art. 121, § 2º, IV, do Código Penal, à pena de 13 anos e 9 meses de reclusão. A defesa interpôs recurso especial alegando nulidade da sessão plenária pela menção à decisão de pronúncia e apontando ainda ilegalidade na dosimetria da pena (art. 59 do CP). O Tribunal de Justiça do Paraná rejeitou a tese de nulidade e manteve a condenação, entendimento que foi reformado pelo STJ.
Segundo Schietti, a restrição legal visa impedir que jurados — cidadãos leigos — sejam influenciados pela autoridade do juiz togado ou por decisões técnicas que indiquem previamente um juízo de culpabilidade. Ao citar precedentes e doutrina, o relator destacou que a nulidade se configura quando a pronúncia é usada como elemento persuasivo para reforçar a tese acusatória ou defensiva, e não apenas mencionada incidentalmente.
Com a anulação do julgamento, o ministro determinou a realização de novo júri e revogou a prisão preventiva decretada para cumprimento imediato da pena, autorizando a expedição de alvará de soltura, salvo se o réu estiver preso por outro motivo. O exame sobre a alegada violação ao art. 59 do CP foi considerado prejudicado diante da anulação da condenação.
O que o art. 478, I, proíbe é transformar a decisão judicial anterior em ferramenta de persuasão pela autoridade (“ad verecundiam”), desviando o foco da análise das provas apresentadas em plenário. O jurado deve formar seu convencimento a partir do que é dito e produzido ali, não do prestígio de um juiz ou tribunal.
AREsp 2783017/PR