Quando o contrato de locação obriga o lojista a assumir sozinho todos os prejuízos com furtos, essa cláusula pode ser considerada inválida, pois impõe um peso exagerado ao comerciante e fere os deveres de boa-fé e equilíbrio do contrato. Se o furto acontece por falha na segurança do shopping, esse risco faz parte da própria atividade do centro comercial, que deve responder pelos danos, conforme prevê o Código Civil.
Sentença do Juiz Rosselberto Himenes, da 7ª Vara Cível de Manaus, condenou o Shopping Manaus Via Norte SPE S/A ao pagamento de R$ 99.874,34 por danos materiais a uma microempresa que teve seu quiosque de telefonia invadido e saqueado durante o feriado de 1º de janeiro de 2024.
Segundo os autos, a empresa vítima, a NoteCell comprovou o furto mediante apresentação de notas fiscais e laudo pericial oficial, que atestou o arrombamento com uso de chave de fenda, empenamento de moldura e coleta de digitais. O magistrado concluiu que houve falha na atividade de guarda, pois o acesso do autor do furto à área controlada não foi impedido ou sequer notado pelos vigilantes.
Ao rejeitar a alegação de fortuito externo, o juiz entendeu que o evento era previsível e evitável com medidas mínimas de segurança. Assim, aplicou a responsabilidade objetiva do centro comercial, fundada no risco da atividade empresarial, conforme previsto no art. 927, parágrafo único, do Código Civil.
A defesa do shopping sustentava a existência de cláusula contratual que transferia ao lojista a obrigação de contratar seguro, isentando o estabelecimento de qualquer responsabilidade. A cláusula, entretanto, foi considerada nula pelo juiz, por afrontar os princípios da função social do contrato (art. 421 do CC) e da boa-fé objetiva (art. 422 do CC), além de impor ônus excessivo à microempresa locatária.
Em relação à seguradora Sompo Seguros S/A, denunciada à lide, a pretensão regressiva foi rejeitada com base em cláusula expressa da apólice que excluía cobertura para furtos ocorridos em quiosques.
Por outro lado, o pedido de indenização por danos morais foi julgado improcedente. Embora reconhecendo que pessoas jurídicas podem sofrer abalo moral (Súmula 227/STJ), o magistrado entendeu que, no caso, não houve demonstração de repercussão negativa à imagem da empresa, como protestos, perda de clientela, exposição negativa ou descrédito no mercado.
A condenação fixou ainda correção monetária a partir da data do furto (01/01/2024) e juros moratórios desde a citação, além da concessão da justiça gratuita e da fixação de honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação.
Processo nº 0459266-22.2024.8.04.0001.