Crimes contra a vida e a integridade física, como o homicídio, em regra não se inserem nos riscos inerentes à atividade empresarial, diferentemente dos crimes patrimoniais, que podem gerar expectativa legítima de segurança em determinados contextos.
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que instituição de ensino superior não responde civilmente por homicídio praticado por terceiros em estacionamento universitário aberto, gratuito e sem controle de acesso, por se tratar de fortuito externo e fato exclusivo de terceiro, alheios aos riscos da atividade educacional.
O entendimento foi firmado no julgamento do Recurso Especial 2.006.711, relatado pelo ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, no qual a Corte reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo que havia condenado a universidade ao pagamento de indenização por danos morais e materiais em razão do óbito de aluno assassinado no estacionamento do campus.
No caso concreto, o crime ocorreu durante o intervalo das aulas, quando terceiros — que não eram alunos — ingressaram no estacionamento de motocicletas da instituição e efetuaram disparos de arma de fogo contra a vítima. Para o TJ-SP, a universidade teria falhado no dever de segurança, aplicando-se a responsabilidade objetiva prevista no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor e a teoria do risco-proveito.
Ao reformar essa conclusão, o STJ destacou que, embora a responsabilidade do fornecedor seja objetiva, ela não é absoluta e pode ser afastada quando o dano decorre de ato exclusivo de terceiro. Segundo o relator, crimes contra a vida e a integridade física, como o homicídio, em regra não se inserem nos riscos inerentes à atividade empresarial, diferentemente dos crimes patrimoniais, que podem gerar expectativa legítima de segurança em determinados contextos.
O voto ressaltou que a jurisprudência da Corte passou a modular a aplicação da teoria do risco-proveito e da Súmula 130/STJ, levando em conta a proteção da confiança e a expectativa legítima de segurança criada no consumidor. No caso dos autos, o estacionamento universitário era gratuito, de livre acesso e sem vigilância ostensiva, circunstâncias que afastariam a criação de expectativa razoável de proteção da integridade física dos usuários.
Para o colegiado, nessas condições, o homicídio configura fortuito externo, pois não era previsível nem prevenível pela instituição de ensino, rompendo o nexo de imputação da responsabilidade objetiva. Assim, foi julgado improcedente o pedido indenizatório, com inversão dos ônus sucumbenciais. As ministras Nancy Andrighi e Daniela Teixeira ficaram vencidas.
RECURSO ESPECIAL Nº 2006711 – SP (2022/0175492-6)
