A iniciativa do Poder Judiciário na produção de provas durante a fase investigativa voltou ao centro do debate no Supremo Tribunal Federal. O ministro Dias Toffoli negou pedido do procurador-geral da República Paulo Gonet para suspender, por tempo indeterminado, uma acareação no inquérito que apura a tentativa de venda do Banco Master ao Banco de Brasília (BRB). A decisão foi proferida na noite de quarta-feira (24).
A audiência está marcada para o dia 30 de dezembro, às 14h, em pleno recesso do Judiciário, e reunirá, numa mesma sessão, Daniel Vorcaro, controlador do Banco Master, Ailton de Aquino, diretor de Fiscalização do Banco Central do Brasil, e Paulo Henrique Costa, ex-presidente do BRB. O objetivo é confrontar versões sobre a negociação e sobre as circunstâncias que levaram à rejeição da operação pelo BC.
No pedido encaminhado ao Supremo, Gonet sustentou que a acareação seria prematura, sob o argumento de que ainda não haveria contradições suficientes nos autos a justificar o confronto direto entre os envolvidos. Toffoli, contudo, afastou a alegação e afirmou que já existem informações divergentes relevantes no inquérito, o que autoriza a produção da prova neste momento.
A decisão chama atenção porque a convocação da acareação não partiu de requerimento da Polícia Federal nem do Ministério Público. Nos bastidores, porém, a avaliação no gabinete do relator é de que o Código de Processo Penal admite a atuação judicial de ofício para a produção de provas, especialmente quando destinadas a esclarecer pontos controvertidos considerados essenciais para a apuração dos fatos.
Segundo interlocutores, o ministro pretende esclarecer, com o ato, quando surgiram as suspeitas de fraude, quem teve ciência dos indícios e quais providências foram efetivamente adotadas — ou deixaram de ser tomadas — tanto no âmbito do BRB quanto na fiscalização exercida pelo Banco Central. Embora a atuação do BC esteja sob análise, nenhum integrante da autarquia figura formalmente como investigado.
A negociação envolvia a compra, pelo BRB, de 58% do Banco Master, aprovada pelo conselho de administração da instituição pública em março, mas posteriormente barrada pelo Banco Central, em setembro. As investigações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal indicam que, antes mesmo da formalização do negócio, o Master teria forjado e repassado ao BRB cerca de R$ 12,2 bilhões em carteiras de crédito consignado, incluindo contratos supostamente inexistentes e valores inflados.
Desde o início de dezembro, Toffoli passou a relatar as medidas relacionadas ao caso no Supremo, após pedido da defesa de Vorcaro para que a investigação fosse remetida à Corte. Apesar disso, o ministro convalidou os atos praticados na primeira instância, preservando a validade das provas já produzidas.
A manutenção da acareação, mesmo diante de parecer contrário da PGR, reacende o debate sobre os limites do poder instrutório do juiz na fase investigativa e sobre o grau de protagonismo do Judiciário em investigações de alta complexidade financeira. No plano jurídico, a medida encontra respaldo formal na legislação processual; no plano institucional, o gesto amplia a tensão entre os papéis tradicionais do magistrado e do órgão acusador.
