Petição sustenta que benefício criado pelo CNMP não tem amparo legal, tem natureza remuneratória e ultrapassa, indevidamente, com burla, o teto constitucional.
Uma ação popular foi ajuizada no Supremo Tribunal Federal contra a Recomendação nº 91/2022 do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). O ato normativo é apontado como responsável por legitimar o pagamento de uma gratificação equivalente a um terço do subsídio mensal a membros do Ministério Público sob o pretexto, indevido, de compensação por “assunção de acervo processual”.
“Ao que tudo indica inspirados na Recomendação n. 91/2022-CNMP, bem como no princípio da paridade no tratamento remuneratório de membros do Ministério Público e do Poder Judiciário, os representantes do sistema de justiça do Brasil passaram a se pagar sem previsão em lei verbas equivalentes a um terço (1/3) de seus subsídios para trabalhar o próprio acervo, o que pode demandar correção pelo Supremo Tribunal Federal, fiador da democracia, que possui como viga basilar o princípio republicano, substancialmente constituído pela isonomia de todos perante a lei”, defende o subscritor da ação, o advogado Jairo Edward De Luca, egresso do MPSP.
Segundo o autor, a medida é inconstitucional, ilegal e antirrepublicana, pois não encontra respaldo em lei federal e acabou permitindo que resoluções internas de Ministérios Públicos estaduais e da União destinassem valores milionários a procuradores e promotores pelo desempenho de funções inerentes ao próprio cargo.
O autor popular defende que o ato é nulo por ilegalidade e inconstitucionalidade, porque omitiu requisitos expressos nas Leis nº 13.093 e 13.095 de 2015, que trataram da mesma matéria no âmbito da magistratura. Tais leis, recorda, estabeleceram natureza remuneratória para a gratificação, condicionaram-na ao acúmulo de jurisdição ou acervo de outra unidade e proibiram que o valor ultrapassasse o subsídio dos ministros do STF.
Segundo a inicial, ao não repetir essas balizas, o CNMP abriu espaço para que procuradores e promotores recebessem a verba pelo simples desempenho de funções ordinárias do cargo, e pior: enquadrando-a como indenizatória — expediente que, na prática, permite escapar do teto remuneratório e da tributação, em frontal divergência do que dispõe a legislação federal.
“As leis foram claras em fixar a natureza remuneratória da compensação. Transformá-la em indenização é uma ficção contábil que afronta o princípio da legalidade e relativiza o teto constitucional”, afirma De Luca.
Paralelo com o Judiciário
De Luca ressalta que até o Poder Judiciário, ao aplicar a Recomendação nº 75/2020 do CNJ, também tem pago a verba em alguns estados sob a rubrica de indenização, embora a própria recomendação tenha seguido fielmente as leis de 2015, que preveem remuneração. Para ele, essa distorção ganhou maior escala no Ministério Público porque o CNMP, ao editar a Recomendação 91, simplesmente deixou de mencionar a natureza remuneratória, o limite do teto e a exigência de acúmulo de funções alheias.
Além disso, o CNJ, ao invés de tomar providências que sugerissem ao CNMP a adoção de medidas para a correção de distorções, findou por criar a Resolução n. 528/2023, no sentido de que se mantenham equalitários os deveres e os direitos entre Magistrados e membros do Ministério Público, ampliando as ‘indenizações’.
Pedidos ao STF
O autor pede que o Supremo declare a nulidade da Recomendação 91/2022 e determine que qualquer futuro ato do CNMP sobre a matéria guarde paralelo com a Recomendação 75/2020 do CNJ, respeitando os limites legais: caráter remuneratório, acúmulo de funções e observância do teto. Em caráter liminar, pede ainda a suspensão imediata dos efeitos da recomendação, para evitar “danos contínuos e bilionários ao erário”.