Com a proximidade do Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado em 5 de junho, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reforçado, por meio de sua jurisprudência, a importância de uma leitura abrangente da responsabilidade civil por danos ao meio ambiente.
Em diversas decisões, a Corte reconheceu que a responsabilidade ambiental não se limita à atuação direta do degradador, alcançando também aqueles que, mesmo de forma indireta, contribuíram para a degradação ambiental — como entes públicos omissos, adquirentes de imóveis degradados e profissionais técnicos que agem com negligência.
A figura do poluidor indireto, prevista no artigo 3º, inciso IV, da Lei 6.938/1981, abrange toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que contribua, ainda que de forma indireta, para atividades causadoras de degradação ambiental. Com base nesse dispositivo, o STJ tem ampliado a responsabilização civil de agentes cuja conduta, ativa ou omissiva, foi relevante para o dano.
Um exemplo marcante é o julgamento do AREsp 1.678.232/SP, em que a Segunda Turma manteve a condenação do município e do estado de São Paulo por omissão na fiscalização de invasões e loteamentos irregulares em áreas de proteção ambiental. O relator, ministro Herman Benjamin, destacou que a omissão do poder público pode configurar causa indireta do dano, ensejando responsabilidade objetiva com base no artigo 23, inciso VI, da Constituição Federal.
Ainda no mesmo ano, o STJ aprovou a Súmula 652, que estabelece que a responsabilidade civil da administração pública por omissão ambiental é de caráter solidário, porém de execução subsidiária. Ou seja, o Estado só poderá ser acionado para reparar o dano ambiental caso o poluidor direto não tenha condições de cumprir a obrigação imposta pela Justiça. Esse entendimento foi aplicado no REsp 1.376.199/SP, no qual a Fazenda Pública estadual foi condenada solidariamente por omissão fiscalizatória, mas com a execução limitada ao caráter subsidiário.
O princípio da solidariedade na reparação de danos ambientais foi novamente discutido no REsp 1.631.143/PA, envolvendo frigoríficos acusados de despejo indevido de resíduos. A Quarta Turma rejeitou a tese de que seria necessária a individualização da conduta de cada empresa para configuração da responsabilidade solidária. Segundo o relator, ministro João Otávio de Noronha, o dano ambiental atinge bem jurídico unitário e sua reparação prescinde da delimitação exata da conduta de cada poluidor.
A jurisprudência do STJ também tem ressignificado conceitos tradicionais do direito civil à luz do direito ambiental. No AREsp 1.945.714/SC, o ministro Og Fernandes defendeu uma interpretação ampliada do nexo causal, afirmando que, nas hipóteses em que diversos agentes contribuem para a degradação, todo ato relevante para o dano — inclusive omissões — pode ensejar responsabilização. No caso, o município de Joinville foi responsabilizado por não fiscalizar uma obra de desvio de rio realizada sem licenciamento ambiental.
Outro marco importante foi a definição da natureza propter rem das obrigações ambientais, firmada no julgamento do Tema Repetitivo 1.204. A Primeira Seção estabeleceu que o dever de reparar o dano ambiental acompanha o imóvel, podendo recair sobre o atual proprietário, mesmo que o desmatamento tenha sido praticado por anterior titular. A ministra Assusete Magalhães, relatora, esclareceu que a inércia do novo possuidor diante da degradação preexistente também configura ato ilícito.
A responsabilidade do poluidor indireto foi ainda reconhecida no âmbito penal. No RHC 118.591/PR, a Quinta Turma entendeu que o engenheiro agrônomo que prescreveu agrotóxicos sem considerar a real necessidade e sem o devido acompanhamento técnico pode ser responsabilizado por danos ambientais. O ministro Ribeiro Dantas aplicou a teoria do domínio do fato para afirmar que o profissional detinha controle funcional da conduta poluente e, mesmo sem praticar o ato material, teve participação relevante no resultado lesivo.
O tema também foi discutido na I Jornada Jurídica de Prevenção e Gerenciamento de Crises Ambientais, realizada em 2024 pelo Conselho da Justiça Federal. Entre os enunciados aprovados, destacou-se o entendimento de que o poluidor indireto responde de forma solidária pela reparação e pela restauração ambiental, sendo esse conceito aplicável inclusive à interpretação da figura do “empreendedor” prevista na Lei 12.334/2010, a partir de uma abordagem ampliada da cadeia causal de danos ambientais.
As decisões do STJ demonstram uma evolução jurisprudencial comprometida com a proteção efetiva do meio ambiente, adotando uma visão sistêmica da responsabilidade ambiental que contempla todos os agentes envolvidos na degradação, mesmo que de forma indireta. Nesse cenário, a figura do poluidor indireto se consolida como elemento fundamental de uma política ambiental eficiente, preventiva e coerente com os princípios constitucionais da precaução, reparação integral e função socioambiental da propriedade.