A alteração unilateral das condições de um serviço de streaming — com a inserção de anúncios não previstos no contrato original — configura prática abusiva e violação direta ao Código de Defesa do Consumidor, definiu o juiz Celso Antunes da Silveira Filho ao condenar a plataforma Prime Video a indenizar um assinante por danos morais decorrentes da inclusão de publicidade não aceita pelo cliente.
A sentença reconheceu que a empresa modificou de forma unilateral a natureza do serviço prestado, passando a exibir anúncios interruptivos a assinantes antigos e exigindo pagamento extra para manter as condições originais do plano contratado — prática que, segundo o magistrado, coloca o consumidor em desvantagem exagerada e viola o art. 51, IV e XIII, do Código de Defesa do Consumidor.
Alteração unilateral e inserção de anúncios surpreenderam o assinante
Segundo a petição inicial, o consumidor contratou o serviço de streaming com a premissa — tradicional no mercado — de acesso ilimitado ao catálogo audiovisual sem interrupção por publicidade, característica típica dos serviços pagos em contraposição aos modelos gratuitos.
No entanto, em abril de 2025, sem comunicação adequada, o serviço passou a inserir propagandas durante filmes e séries. O assinante só descobriu as mudanças ao tentar assistir ao conteúdo.
Simultaneamente, a plataforma lançou um novo modelo de assinatura: quem desejasse manter a experiência sem anúncios teria que pagar adicionais, elevando o valor total mensal. Para o juiz, a manobra constitui estratégia predatória e “modificação unilateral de cláusulas contratuais essenciais”.
Ônus da prova invertido e ausência de comprovação do alegado pela ré
O magistrado destacou que o ônus da prova havia sido invertido, como autoriza o art. 6º, VIII, do CDC. Mesmo assim, a empresa não apresentou documentos ou registros técnicos aptos a demonstrar que: houve comunicação prévia adequada da mudança; o plano contratado originalmente incluía a possibilidade de inserção futura de anúncios; a cobrança adicional estava prevista contratualmente.
Para o juiz, alegações abstratas acompanhadas de telas unilaterais não eram suficientes: “Não é apenas diante de uma tela de computador que se tenta equacionar e elucidar as questões postas na causa de pedir.” A inércia probatória da ré levou o juízo a reconhecer os ilícitos.
Violação à boa-fé e prática abusiva
A sentença classificou as alterações como: abuso contratual (arts. 39 e 51 do CDC); alteração unilateral lesiva; prática que impõe desvantagem exagerada ao consumidor; violação à boa-fé objetiva (art. 422 do Código Civil). A conduta, para o juiz, “desbordou do mero aborrecimento” e interferiu diretamente na experiência contratada.
Indenização e obrigações impostas
O juízo reconheceu a abusividade da alteração do contrato; condenou a empresa ao pagamento de R$ 2.000,00 a título de danos morais; determinou que a ré se abstivesse de cobrar o valor adicional para remoção dos anúncios; fixou prazo de 60 dias para cumprimento e multa de R$ 5.000,00 em caso de descumprimento.
Fenômeno jurídico em destaque
A decisão reforça importante limite à liberdade contratual nas relações de consumo: Serviços digitais não podem degradar unilateralmente as condições originalmente pactuadas. O juiz aplicou o raciocínio clássico do sistema protetivo: contratos firmados sob determinada expectativa não podem ser alterados pelo fornecedor sem: comunicação adequada, anuência expressa, e sem gerar desequilíbrio contratual. Quando isso ocorre, surge a responsabilidade civil objetiva, bastando o defeito na prestação do serviço.
