“Danos morais configurados, devendo ser pago o valor de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), a ser dividido entre os genitores do custodiado vítima de guerra de facções em presídio do Estado do Amazonas.”
O Tribunal de Justiça do Amazonas, decidiu, a pedido de Petrônio Abreu Cavalcante e Marilene Vieira Cavalcante, contra sentença lançada em ação indenizatória julgada improcedente pelo juízo da 5ª Vara da Fazenda Pública, concluindo que a guarda e a preservação da integridade física dos cidadãos que estejam presos tenha indiscutível responsabilidade objetiva do Estado. O julgado veio como resposta à insatisfação dos Recorrentes, que, em primeira instância, teriam sido derrotados na ação, pois o juízo teria concluído que a ocorrência de confrontos entre o crime organizado, no interior dos complexos prisionais, é capaz de afastar a obrigação que tenha o Estado de salvaguardar vidas de presos dentro do sistema prisional e dentro dessas circunstâncias. O fato se refere ao motim de presos ocorrido em 2019, com mortes decorrentes de asfixia, golpes, estocadas de armas, armas artesanais improvisadas até com escovas de dentes. Foi Relatora Joana dos Santos Meirelles.
Segundo a decisão recorrida os massacres que teriam ocorrido nos dias 26 e 27 de maio de 2019 não decorreram do resultado da omissão estatal mas sim por atuação de grupos criminosos organizados, o que iria além da possibilidade de ações estatais de dar provimento a medidas de segurança que pudessem evitar drásticas consequências como a morte do detento que fora objeto de pedido de indenização e pensionamento pelos Requerentes.
A Sentença teria aborda, ainda, que o fato seria daqueles cujo controle teria saído sem que se pudesse imputar responsabilidades pela vigilância do sistema de segurança penitenciária. ‘As ações de bando, especialmente rebeliões ou ações de grupos criminosos organizados são passíveis de acontecer e estas, por vezes, podem sair do controle, como foi o caso’, firmara a sentença reformada.
Segundo o Acórdão, o Estado não pode ter, sobre si, o manto protetor da imunidade às consequências advindas de rebeliões ou confrontos entre organizações criminosas rivais, até porque, se essa hipótese fosse consistente, toda a sociedade restaria refém dos desmandos do poder paralelo, firmou o julgado, em acolhimento à unanimidade de voto condutor da Desembargadora.
Leia o Acórdão:
Tribunal de Justiça do Amazonas. Gabinete da Desembargadora Joana dos Santos Meirelles. Apelação Cível nº 0649872-80.2019.8.04.0001 – Manaus. Desembargadora Relatora: Joana dos Santos Meirelles. EMENTA: PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. MORTE DE CUSTODIADO NO CENTRO DE DENTENÇÃO PROVISÓRIA MASCULINO. MASSACRE. GUERRA ENTRE FACÇÕES RIVAIS. IMPOSSIBILIDADE DE SE CONSIDERAR COMO FATO INEVITÁVEL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. DANOS MORAIS. CONFIGURADOS. PENSIONAMENTO. PRECEDENTE DO STJ. CABÍVEL. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O Estado possui responsabilidade objetiva, conforme inteligência do Art. 37, § 6º da Constituição Federal de 1988, devendo reparar eventuais danos causados, tanto na esfera patrimonial quanto moral, bastando que estejam presentes o dano e o nexo causal. 2. No caso em tela, um jovem de 21 anos foi uma das vítimas do massacre ocorrido em diversas unidades do sistema prisional amazonense, em maio de 2019, devido a guerra entre organizações criminosas rivais. 3. Ao contrário do que entendeu o MM. Juízo de piso, o Estado não estaria imune à rebeliões ou confrontos entre organizações criminosas rivais, porquanto se o Estado não tiver a capacidade de contê-los, toda a sociedade vira refém dos desmandos do poder paralelo, submetendo qualquer um a situações de extremo perigo, enquanto o Estado deita em berço esplêndido, “sem nada poder fazer”. Tal decisão, com a devida vênia, premia o ente por sua incompetência em conter o crescimento do crime organizado, até mesmo dentro dos presídios, onde deveria ter o absoluto controle, o que não pode ser mantido. 4. Danos morais configurados, devendo ser pago o valor de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), a ser divido entre os genitores do falecido, ora Apelantes. PODER JUDICIÁRIO. Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas