Andar com sacola em bairro de risco não justifica baculejo, decide STJ sobre caso em Manaus

Andar com sacola em bairro de risco não justifica baculejo, decide STJ sobre caso em Manaus

Em decisão que reafirma os limites da atuação policial e a proteção constitucional à intimidade, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que carregar uma sacola em bairro considerado “de risco” não constitui, por si só, justa causa para abordagem e revista pessoal.

O caso julgado envolve um morador de Manaus que foi submetido a um “baculejo” enquanto caminhava em via pública, no bairro Santo Agostinho, sob o argumento de estar em “atitude suspeita”.

A Sexta Turma do STJ, por maioria, manteve decisão monocrática do ministro Sebastião Reis Júnior que havia concedido habeas corpus em favor do réu, assistido pela Defensoria Pública do Estado do Amazonas. O colegiado rejeitou o agravo do Ministério Público estadual e confirmou a nulidade das provas obtidas na revista, que resultara na apreensão de pequenas porções de cocaína e maconha.

Segundo o relator, a conduta dos policiais — que decidiram abordar o réu apenas por estar “andando com uma sacola em área de tráfico” — não atende ao requisito legal de fundada suspeita previsto no artigo 244 do Código de Processo Penal. “A medida invasiva foi motivada apenas por impressão subjetiva, sem nenhum elemento concreto que indicasse a posse de arma, droga ou objeto ilícito”, escreveu o ministro.

Revista exploratória e subjetivismo policial

O STJ reafirmou, mais uma vez, o entendimento firmado no RHC 158.580/BA, julgado em 2022, quando a Corte reinterpretou o alcance do art. 244 do CPP e vedou as chamadas revistas exploratórias, também conhecidas como fishing expeditions. Nessas situações, a polícia age movida por “sensações” de suspeita — como nervosismo, aparência, localidade ou gestos — sem base objetiva verificável.

No caso de Manaus, os ministros entenderam que o simples fato de o abordado estar em um bairro conhecido por tráfico de drogas não legitima a violação da esfera individual. “Não se pode admitir que o rótulo de ‘área de risco’ transforme qualquer cidadão em suspeito”, observou Sebastião Reis Júnior.

O relator aplicou a teoria dos frutos da árvore envenenada, declarando ilícitas todas as provas derivadas da busca pessoal irregular, inclusive a confissão extrajudicial. Com isso, foi restabelecida a decisão de primeiro grau que havia rejeitado a denúncia do Ministério Público por ausência de justa causa.

Decisão e composição

A Turma seguiu o voto do relator, com adesão dos ministros Rogerio Schietti Cruz, Antonio Saldanha Palheiro e do desembargador convocado. Ficou vencido o ministro Og Fernandes, que divergiu para reconhecer a validade da prova.

Jurisprudência consolidada

Com a decisão, o STJ reforça o papel de controle sobre práticas policiais baseadas em impressões subjetivas e mantém a linha jurisprudencial que condiciona qualquer revista pessoal à demonstração concreta e objetiva de fundada suspeita.

 AgRg no HC nº 977.998/AM 

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