Corte reconhece ilicitude de provas obtidas em busca domiciliar baseada apenas em denúncia anônima.
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a absolvição de um homem preso em Manaus após busca domiciliar sem mandado judicial motivada por denúncia anônima não verificada.
O colegiado, sob relatoria do ministro Otávio de Almeida Toledo, negou provimento ao agravo regimental interposto pelo Ministério Público do Amazonas, reafirmando que sem diligência prévia e sem consentimento válido do morador, o ingresso em domicílio é ilícito, ainda que haja apreensão de drogas.
A origem do caso
O processo teve início quando policiais militares, a partir de denúncia anônima, foram até a casa do suspeito, onde encontraram pequena quantidade de maconha e uma balança de precisão. Não havia mandado judicial, nem prova de que o morador tivesse autorizado a entrada dos agentes — tampouco registro audiovisual da suposta permissão.
A Defesa impetrou habeas corpus alegando violação ao domicílio e prova ilícita, o que levou o relator a conceder a ordem de ofício. O Ministério Público recorreu, sustentando a existência de flagrante e a natureza permanente do crime de tráfico, mas o STJ manteve o entendimento pela nulidade da diligência e pela absolvição do acusado.
O fundamento constitucional
Ao votar, o ministro relator recordou que a Constituição Federal, em seu artigo 5º, XI, protege o domicílio como asilo inviolável, só permitindo ingresso com mandado judicial, consentimento comprovado ou flagrante delito devidamente caracterizado. Nenhuma dessas hipóteses teria se verificado no caso examinado.
“A denúncia anônima, desacompanhada de diligências investigativas preliminares, não constitui justa causa para busca domiciliar. E a pequena quantidade de drogas encontrada não legitima o ingresso forçado”, afirmou o relator.
Com base no artigo 157 do Código de Processo Penal, que invalida provas ilícitas e as delas derivadas, o colegiado declarou inidônea toda a prova produzida e reconheceu a ausência de materialidade do crime, aplicando o artigo 386, II, do CPP para absolver o réu.
A jurisprudência reafirmada
A decisão citou precedentes paradigmáticos da Corte, como o HC 598.051/SP, relatado pelo ministro Rogerio Schietti Cruz, que fixou parâmetros para o consentimento válido em buscas domiciliares, exigindo registro escrito e audiovisual da autorização. Também foram mencionados o AgRg no HC 516.746/SP e o HC 512.418/RJ, ambos no sentido de que a simples suspeita policial ou a fuga do indivíduo não configuram justa causa para invasão de domicílio.
O relator destacou que a orientação do STJ está em harmonia com o Tema 280 do STF, segundo o qual “a entrada forçada em domicílio sem mandado só é lícita quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori”.
Processo: AgRg no HC 872.922/AM